Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Chamado de doido, treinador Lisca é mais sensato que Bolsonaro
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O gaúcho Luiz Carlos Cirne Lima de Lorenzi é treinador conhecido pelos amantes do futebol por dois apelidos. Um simples, Lisca, e outro mais irreverente, Lisca Doido. A "doidice" lhe foi atribuída pelo comportamento irrequieto em campo, o jeitão de torcedor que o faz pular, correr e gritar a cada lance importante do seu time.
De doido, no entanto, Lisca não tem nada. É um técnico de futebol competente, adorado pelas torcidas dos clubes por onde passou. Sua mais recente façanha foi ajudar o América-MG a subir da segunda para a primeira divisão do Campeonato Brasileiro.
Além disso, Lisca também é bastante sensato com as palavras. Em entrevistas recentes, se posicionou contra o racismo e a homofobia no futebol.
Ontem, após uma vitória do seu time no Campeonato Mineiro, ele mais uma vez se mostrou uma pessoa sensata. Preocupado com o início da Copa do Brasil, competição em que os jogadores e comissões técnicas têm que se deslocar para vários estados, pediu o adiamento das partidas, preocupado com a pandemia de covid-19.
"Eu sou pai de família, tenho duas filhas e uma esposa. Eu quero viver, gente", apelou Lisca, falando às câmeras de TV. "Tem pessoas que pegam e morrem, tem pessoas que pegam e nada acontece, tem pessoas que são intubadas e agora você nem pode mais intubar".
Enfático, ele pediu vacina para todos e apelou a outros personagens do esporte para que se manifestem. "O que está acontecendo com o nosso país?", questionou. "Por favor, presidente (da CBF, Rogério) Caboclo. Tite, nós precisamos do seu posicionamento. Você é o treinador principal do país. Não deixe acontecer conosco isso, Tite. Pelo amor de Deus! Dá para dar uma segurada".
Com a perspectiva macabra de o país ultrapassar a marca diária de 2 mil mortos, o apelo de Lisca faz todo sentido.
Mesmo sob apelido de "doido", o treinador do América tem muito mais senso de realidade que a principal autoridade política do país. Ontem, no mesmo dia em que Lisca se manifestava pela suspensão do futebol, o presidente Jair Bolsonaro dava mais uma demonstração de irresponsabilidade.
"Se depender de mim, não tem lockdown", esbravejou Bolsonaro.
No momento em que o Brasil está perto de registrar 260 mil mortos por coronavirus, o presidente não toma qualquer medida adicional, não monta gabinete de crise e ainda faz militância contra as medidas preventivas adotadas por governadores e prefeitos.
Hoje, na cidade mineira de Uberlândia, o ocupante do Palácio do Planalto voltou a tratar do tema. Tentou mais uma vez tirar de seus ombros a responsabilidade, repetindo a história mentirosa de que o Supremo Tribunal Federal o impediu de agir.
Depois de atrasar o quanto pôde o processo de compra de imunizantes, respondeu de forma grosseira àqueles que, como Lisca, cobram agilidade do governo: "Tem idiota que a gente vê nas redes sociais, na imprensa, (dizendo) 'vai comprar vacina'. Só se for na casa da tua mãe. Não tem para vender no mundo."
Em outro compromisso, elevou o desrespeito às vítimas da pandemia e seus familiares a um grau inimaginável: "Chega de frescura e de mimimi. Vão ficar chorando até quando? Temos de enfrentar os problemas".
A vida dos brasileiros parece importar menos a Bolsonaro que demonstrar que tem coragem de manter sua posição até o fim, mesmo errado.
Em sua mente delirante não há espaço para a empatia.
O contraste entre os posicionamentos do treinador Lisca e do presidente Bolsonaro é gigantesco. Um demonstra noção da gravidade da situação, outro vive em mundo paralelo.
Diante dos dois, basta somente uma pitada de sensatez para identificar quem na verdade precisa urgentemente de tratamento psiquiátrico.
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