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Chico Alves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

A diferença entre Braga Netto e Fernando Azevedo, o general que disse 'não'

Generais Walter Braga Netto e Fernando Azevedo e Silva - Divulgação e Agência Brasil
Generais Walter Braga Netto e Fernando Azevedo e Silva Imagem: Divulgação e Agência Brasil

Colunista do UOL

10/08/2021 17h07

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Nos últimos anos, as trajetórias dos generais Walter Braga Netto e Fernando Azevedo e Silva estiveram bem próximas. Ambos aceitaram fazer parte do núcleo duro do governo de Jair Bolsonaro. Por mais de dois anos, Braga Netto ocupou a Casa Civil. No mesmo período, Azevedo e Silva comandou o Ministério da Defesa. Saiu em março e foi sucedido por Braga Netto.

Ao cometerem o desatino de embarcar no governo de alguém tão desqualificado quanto Bolsonaro, a ideia inicial seria que os dois generais recorressem à camaradagem da caserna para manter sob controle o presidente, conhecido pelo temperamento difícil. No decorrer do governo, no entanto, deu-se o contrário: Braga Netto e Azevedo e Silva foram "bolsonarizados" pelo presidente.

Vários desatinos do chefe do governo tiveram a companhia desse par de oficiais. Eles estavam ao lado de Bolsonaro em várias micaretas antidemocráticas que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Azevedo e Silva foi além. Estava junto do presidente da República na aeronave que em maio de 2020 sobrevoou a Praça dos Três Poderes no momento em que uma dessas manifestações juntava lunáticos para clamar por intervenção militar. Foi seu maior erro.

Depois da repercussão negativa do passeio aéreo, o ministro da Defesa da época foi-se tornando cada vez mais discreto. Mesmo contra a vontade de Bolsonaro, que o incitava a colaborar com a vinculação de sua imagem às Forças Armadas, submergiu.

Nesse período, Fernando Azevedo e Silva disse alguns "nãos" ao presidente. A negativa crucial, no entanto, foi revelada pela jornalista Malu Gaspar, do jornal O Globo: em março do ano passado, Bolsonaro queria fazer uma demonstração de força semelhante a que aconteceu hoje.

O comandante do Exército da época, general Edson Pujol, negou-se a obedecer essa ordem disparatada. Azevedo e Silva bancou a decisão. Como se sabe, foi defenestrado. Também Pujol e os comandantes da Marinha e da Aeronáutica foram trocados.

Na cordial nota de despedida do cargo de ministro da Defesa, Azevedo e Silva observou: "Nesse período, preservei as Forças Armadas como instituições de Estado".

Em seu lugar, assumiu Walter Braga Netto.

Desde então, Bolsonaro passou a ter o parceiro ideal para tentar materializar seus desvarios autoritários. Pitacos sobre voto impresso, ameaças à realização de eleições, reprimendas à CPI da Covid, todas essas aberrações tiveram participação de Braga Netto.

O auge deu-se hoje.

O atual ministro da Defesa fez o que seu antecessor teve a hombridade de negar. Foi um dos principais responsáveis pelo maior vexame que as Forças Armadas passaram desde a redemocratização.

Na frase final da nota de despedida da pasta da Defesa, Fernando Azevedo e Silva escreveu: "Saio na certeza da missão cumprida". Na missão de manter a salvo a respeitabilidade das Forças Armadas, seu principal gesto foi recusar a parada fora de época proposta por Bolsonaro.

Com Braga Netto foi diferente. Passando por cima do princípio militar segundo o qual ordem absurda não deve ser cumprida, o atual ministro da Defesa só diz "sim" às sandices do presidente. O desfile de hoje foi o ponto alto dessa submissão.

De casa, de onde observou a lamentável exibição, Fernando Azevedo e Silva deve ter ficado ainda mais convicto que sua maior colaboração às forças que tanto respeita pode ser resumida em uma pequena palavra: "não".