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General Augusto Heleno veste toga e cria a jurisprudência do golpe
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Não são raros os oficiais das Forças Armadas que se acham superiores à população civil. Com esse discurso de superioridade moral, muitos desses personagens foram parar no governo de Jair Bolsonaro. Por isso, gente que fez carreira na caserna tem hoje no Executivo tarefas tão diferentes como cuidar da Amazônia, da Ciência e Tecnologia ou do Ministério da Saúde.
O resultado desastroso nas áreas citadas deveria ser suficiente para provar que fardas não são uniformes de super-heróis.
Tanto faz que o servidor seja civil ou militar, desde que tenha a humildade de estudar os temas sobre os quais vai se debruçar e valorizar os especialistas de cada setor. Os fardados do governo, no entanto, dispensaram os conhecedores de cada área (pesquisadores do Inpe e epidemiologistas do Ministério da Saúde, para citar alguns) e se guiaram por suas próprias certezas. Deu muito errado.
Não se vê nem sinal de autocrítica. Pelo contrário: alguns generais do governo querem estender ainda mais sua área de atuação.
É o caso de Augusto Heleno, o titular do Gabinete de Segurança Institucional. Ontem, em entrevista a uma rádio bolsonarista, ele se atribuiu autoridade jurídica para decidir questões constitucionais. Foi na contramão do que entende o Supremo Tribunal Federal (STF).
O ministro do GSI voltou ao famigerado artigo 142 da Constituição para dar a mesma interpretação que a turba das manifestações antidemocráticas volta e meia pede, a de que o texto confere às Forças Armadas um tal poder moderador.
A leitura é diametralmente oposta à do ministro Luiz Fux, do STF.
"O artigo não diz quando os militares devem intervir, mas diz que é para manter a tranquilidade do país. E pode acontecer em qualquer lugar. Não há planejamento", delirou Heleno.
O ministro-general vestiu a toga e desconsiderou completamente a decisão da instituição que tem a atribuição legal de dirimir dúvidas sobre artigos constitucionais.
Coincidentemente, na mesma noite em que Heleno criava sua jurisprudência particular, a ministra Cármen Lúcia reiterava em entrevista à jornalista Miriam Leitão que as Forças Armadas não são poder moderador. Na verdade, não são sequer um poder.
"Não existe quarto poder", assinalou Cármen Lúcia.
Em depoimento prestado hoje na Câmara dos Deputados, o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, concordou com a interpretação da ministra. "O país somente tem três Poderes, o país tem o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, que têm que estar harmônicos, trabalhar e ser independentes", afirmou.
Espera-se que Braga Netto consiga convencer o colega de governo Augusto Heleno que, ao contrário do que falou na entrevista de ontem, o tal poder moderador não existe.
A insistência nessa interpretação destrambelhada não pode ser chamada de outra forma senão pela palavra que infelizmente tem sido muito pronunciada ultimamente: golpe.
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