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Chico Alves

REPORTAGEM

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Delegado Saraiva denuncia ao MP manipulação na alocação de agentes da PF

Delegado Alexandre Saraiva - Reprodução de vídeo
Delegado Alexandre Saraiva Imagem: Reprodução de vídeo

Colunista do UOL

13/12/2021 10h22

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O delegado Alexandre Saraiva encaminhou hoje aos chefes do Ministério Público Federal nos estados da Amazônia representação em que denuncia manipulação no processo de alocação de novos agentes da Polícia Federal através de portaria publicada pelo Ministério da Justiça no final de novembro. Segundo ele, a mudança de critérios permitirá que policiais recém-formados evitem postos em locais mais distantes e inóspitos, como áreas de fronteira na floresta, e sejam encaminhados através de convite para cargos lotados em Brasília, sem limitação de quantidade.

Saraiva alerta que, além de ferir o direito de agentes que se destacaram na prova e dos mais antigos, a portaria tanto vai dificultar o preenchimento de vagas em áreas distantes como a Amazônia, onde o déficit de pessoal é um dos motivos para a diminuição de repressão a crimes como desmatamento e garimpo ilegal, como vai permitir o aparelhamento de grupos de policiais que serão "apadrinhados".

A escolha das vagas se dava exclusivamente com base na classificação geral do concurso ou na classificação específica do candidato no curso de formação. Mesmo assim, relata o delegado na representação a que a coluna teve acesso, o "apadrinhamento" irregular ocorreu até 2007, quando a prática foi abandonada. Saraiva define essa manobra como "um abominável favoritismo em prol daqueles candidatos que possuíam 'costas quentes', por meio de um instituto não regulamentado, denominado 'convite' que burlava os editais do concurso".

"A prática do apadrinhamento fez com que muitos policiais deixassem de atuar nas lotações de difícil provimento", relata ele. "Desta forma, os afortunados nunca escolheram unidades com 'claros de lotação' localizadas nos rincões mais distantes do país".

O delegado denuncia que a partir de agora tal prática foi institucionalizada com a nova portaria. Para piorar, o texto que fundamenta a mudança foi colocado sob sigilo, critica.

Alexandre Saraiva foi exonerado do cargo de superintendente da Polícia Federal no Amazonas após pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) investigação contra o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles por associação ao contrabando de madeira da Amazônia. Trabalha atualmente na cidade de Volta Redonda (RJ).

"É de espantar que a Portaria não limita o número de futuros policiais que poderão ser agraciados pelo 'convite'. Deste modo, a Direção Geral estará livre para lotar em Brasília quantos quiser. Esta circunstância denota a intenção de desviar muitos futuros policiais da região amazônica, do pantanal e das fronteiras para Brasilia. Assim, o texto da portaria nº 15.755-DG/PF traduz um verdadeiro 'brasilionocentrismo'", diz a representação.

Em seu documento, o delegado destaca que "o policial de cativeiro tem dono" e essa seria a "melhor forma de aparelhar uma instituição policial e cooptar seus integrantes desde o nascedouro".

Ele recorda que, por resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Polícia Federal exercerá, com prioridade sobre suas atribuições regulares, a função de polícia judiciária nas matérias relativas às eleições.

A coluna enviou à Polícia Federal questionamentos sobre o assunto e as respostas enviadas foram as seguintes:

"1. Não há "convite". O que existe é um processo seletivo de alunos cujas capacidades e habilidades desejadas estão definidas claramente na portaria e devem ser comprovadas no momento da inscrição. Estas habilidades e capacidades específicas se referem à experiência profissional pretérita dos candidatos que, no curso de sua vida profissional, investiram em sua capacitação profissional de maneira diferenciada.

2. Não haverá dificuldades para o preenchimento das vagas de difícil provimento pelos alunos. O processo de compilação das vagas que serão oferecidas aos alunos é complexo e passa pelo mapeio das unidades que têm urgência no recebimento de reforço em seu efetivo. Após a identificação destas unidades é feito o dimensionamento da força de trabalho que será destinada a cada uma delas. Estas vagas serão oferecidas no momento oportuno da escolha de vagas aos alunos que não participaram do processo seletivo objeto regulamentado pela Portaria nº 15.775-DG/PF.

3. O processo seletivo regulamentado pela Portaria nº 15.775-DG/PF tem critérios objetivos, isto é, a capacitação dos candidatos. Apenas aqueles profissionais que apresentem condições técnicas (desenvolvidas previamente a sua vinculação ao quadro da Polícia Federal) de contribuir ao bom desempenho das unidades centrais é que serão selecionados. Não se trata de convite e não haverá pessoalidade na escolha dos candidatos.

4. Não houve decretação de sigilo. O que existe é que, com o fim de manter a compartimentação das informações que transitam nos sistemas informatizados da Polícia Federal, os processos apenas podem ser visualizados pelos servidores das unidades pelas quais os processos tramitam".