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Chico Alves

REPORTAGEM

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Esquerda tem que apostar nos jovens, diz líder de estudantes secundaristas

Rozana Barroso, presidente da Ubes (com título de eleitor na mão) - Divulgação
Rozana Barroso, presidente da Ubes (com título de eleitor na mão) Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

30/04/2022 04h00

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Há muito tempo o Brasil não tem tão poucos eleitores com 16 e 17 anos. Há pouco mais de um mês, apenas um em cada cinco jovens nessa faixa etária estava apto a participar do processo eleitoral. É uma quantidade 25% menor que a registrada em 2018 nesse mesmo período do ano e 60% menor que o contingente de 2004. Para tentar reverter essa defasagem, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas disparou a campanha "Se Liga, 16", para incentivar os adolescentes a tirar o título. O prazo final é 4 de maio.

À frente da mobilização está Rozana Barroso, presidente da Ubes. Ela falou à coluna sobre os motivos que acredita serem os causadores da baixa adesão dos mais novos ao processo eleitoral. "Há uma grande desesperança entre os jovens", diz a líder estudantil. "Eles perderam a perspectiva de futuro". (Veja aqui a entrevista em vídeo)

Além disso, os ataques à democracia perpetrados pelo governo de Jair Bolsonaro desanimam essa parcela da população, acredita Rozana. A esquerda também é alvo de críticas por resistir a incluir temas caros à juventude em seu plano de ação e tornar difícil a inclusão desses quadros na política.

"É justo que a gente queira estar do outro lado da mesa", afirma a presidente da Ubes.

UOL - Na sua opinião, qual a causa da adesão tão baixa dos jovens de 16 e 17 anos ao processo eleitoral?

Rozana Barroso - Acho que principalmente a desesperança. Nós estamos vivendo um momento muito difícil para a juventude brasileira. O agravamento da desigualdade social, o abandono escolar e universitário, o desemprego e o subemprego entre a juventude, a falta de perspectivas. Em 2021, tivemos o Enem com o menor número de inscritos em treze anos. Esses jovens perderam a perspectiva de futuro.

Muitos deles talvez pensem "poxa é só mais um voto, só um título, eu não vou mudar nada". Aí, entra a nossa campanha conscientizando sobre a importância de exercer a democracia. E mais do que isso, mostramos que nós podemos mudar essa realidade. Nossa campanha entra exatamente para combater esse tipo de desesperança que, acredito eu, é uma coisa forte exatamente pela dificuldade que a gente vem passando. Mas, como a gente tem dito na campanha, é possível mudar sim ocupando as urnas com nosso voto.

Pelos comentários que você ouve dos jovens, quais os principais motivos para essa desesperança? Falta de representatividade, denúncias de corrupção, inutilidade da política?

Tudo junto, né? Eu acho que nós temos uma parcela de jovens que precisaram parar de estudar para ajudar os pais a comprar os alimentos. Hoje o assunto do dia é inflação. O gás de cozinha vai bater quase R$ 200. Então, nós estamos falando de jovens que estão no sinal, vendendo jujuba, com uma mochila de aplicativo de entrega nas costas. Às vezes, muitos menores de idade. A escola, a universidade, se torna algo cada vez mais distante. Escândalos e mais escândalos de corrupção agora envolvendo o Ministério da Educação, que deveria pensar em como me incluir de volta no acesso à educação pós-pandemia e estava aí envolvido. Então, esse é um dos motivos.

Eu acho que o ataque à democracia que a gente vive nesse momento também assusta e desanima muitos jovens brasileiros. Nós temos falas terríveis, inclusive nesse sentido de ataque à democracia, de ataque à liberdade.

A questão de representatividade também. A gente sempre fala sobre isso. A necessidade de fazermos políticas de jovens para jovens. Porque às vezes o jovem liga a televisão, vê ali uma pessoa mais velha, com terno, e ele não entende nada do que estão falando. É também uma campanha que fala o seguinte: olha, dá para você ocupar a política e falar também da sua realidade.

Eu acho que é um combo dessas coisas que desanima a juventude brasileira e faz com que ache que talvez seu voto não mude nada. É com o contrário desse pensamento que a gente tem tentado tocar a campanha aí pelas escolas brasileiras.

Você acha que os políticos de esquerda estão contemplando esse jovem? Especialmente os da periferia?

Eu acho que englobar todo mundo em uma coisa só é um pouco complicado. Nós temos setores que de fato falam mesmo mais com a classe média. Mas na luta que eu atuo, por exemplo, é totalmente o contrário. Inclusive porque a luta em defesa da educação se dá em maior parte com os estudantes das escolas públicas, que são os estudantes da periferia, estudantes pobres, estudantes quilombolas, indígenas, negras. Então eu não vivo essa dificuldade de diálogo com a periferia, porque eu sou da periferia, falo pelos meus. É muito essa questão do "nós por nós".

Temos de fato alguns setores com essa dificuldade. Por exemplo, o Lula tirou uma foto junto com Geraldo Alckmin lá filiação dele ao PSB. Figuram na foto só pessoas brancas, acho que só duas mulheres. O movimento negro pontuou isso no Twitter, que é importante que a gente possa pensar as figuras negras do lado de lá da mesa. Teve muita gente que chamou aquilo ali de mimimi, de identitarismo, de pós-moderno...

É justo que a gente se indigne se ali não tem gente como nós.

Quais os resultados da campanha da Ubes para que os adolescentes tirem o título de eleitor?

A nossa campanha pede o título na mão para defender a educação. A gente tem falado muito sobre a importância de exercer a democracia e levar a nossa luta das redes, das ruas, também para as urnas. O voto é muito importante para que a gente possa ligar a televisão e ver pessoas como nós (na política), que nos representa, pessoas que defendam a educação, que defendam a nossa escola, a nós que ingressamos no ensino superior.

A gente tem falado isso com a juventude brasileira que está desesperançosa com atual governo, mas que está na disposição para mudar. A gente olhou pro número bem mais baixo do que os últimos anos e aceitamos o desafio. "Vamos fazer essa juventude toda tirar o título de eleitor". Assim a gente montou em muitas escolas, em cada cantinho desse país, os nossos "guardiões da democracia", que são banquinhas, ficam no pátio da escola, no computador, no celular, para incentivar e tirar o título desses estudantes.

Conseguimos contato com a Anitta, com a Juliette, com todo mundo que entrou para compartilhar essa campanha. A gente bateu mais de um milhão de títulos tirados e agora estamos na reta final, já planejando uma mega-live com os influenciadores para incentivar o eleitor.