Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Sociedade civil mostra às Forças Armadas para onde deve marchar o Brasil
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São muitas as formas de ataque do presidente Jair Bolsonaro (PL) à democracia brasileira: orçamento secreto, negacionismo, incentivo ao uso de armas, abandono das populações indígenas, cooptação da Procuradoria-Geral da República, falta de políticas duradouras para amenizar a fome. Tudo isso de alguma forma distorce as atribuições institucionais dos três poderes ou incentiva o caos. A mais grave agressão de Bolsonaro ao Estado de Direito, porém, é a campanha difamatória contra o processo eleitoral do país.
Essa fixação do presidente não causaria maior apreensão se não estivessem a seu lado, também divulgando dúvidas infundadas contra a urna eletrônica, as Forças Armadas - ou ao menos seus comandantes.
Nos últimos meses, a sociedade assistiu atônita os generais da reserva Walter Braga Netto, Luiz Eduardo Ramos e, em especial, Paulo Sérgio Nogueira (ministro da Defesa), tentarem a todo custo bagunçar a preparação das eleições. A estes se juntou ontem o comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes, que emitiu nota em defesa de um coronel escolhido para a comissão de fiscalização do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) flagrado divulgando fake news sobre as urnas eletrônicas e fazendo proselitismo político nas redes sociais em favor de Bolsonaro.
O movimento não parece ser aleatório. Desde que, em 2015, o então comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, permitiu que se abrissem as portas dos quartéis para que Bolsonaro divulgasse suas ideias antidemocráticas aos jovens militares, a institucionalidade brasileira passou a ficar sob risco. O que acontece agora é a conclusão de um roteiro macabro que teve apoio de muitos fardados.
Diante da escalada de seguidos ataques ao processo eleitoral, a sociedade civil por muito tempo pareceu anestesiada.
Como fracassaram as inúmeras tentativas de reverter as diatribes de Bolsonaro contra as urnas eletrônicas e ao TSE, a sociedade finalmente acordou.
O ato de hoje, na Universidade de São Paulo (USP) e em vários pontos do país, é o marco desse despertar.
A carta elaborada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) repete o simbolismo da Carta aos Brasileiros, lida pelo jurista Goffredo da Silva Telles nas arcadas da USP em 1977. Foi um marco contra a ditadura.
A manifestação de hoje foi um marco na luta contra o avanço daqueles que em pleno 2022 querem instalar uma autocracia no Brasil.
Como resumiu o ex-ministro José Carlos Dias, que leu o manifesto "Em defesa da democracia e da Justiça", o ato reuniu representantes do capital e do trabalho em defesa da democracia. Realmente estavam lá, por exemplo, integrantes da Fiesp e da CUT.
A sequência de oradores mostrou que a variedade foi ainda mais ampla.
Compareceu o jurista Oscar Vilhena Vieira, explicando que, dada a gravidade do momento que vivemos, todos ali tiveram a capacidade de transcender as suas lutas próprias para se juntar a uma única luta, pelo Estado de Direito. Ao mesmo tempo, também se fez presente a dirigente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) Telma Victor, que falou contra a fome.
Usou o microfone o economista Armínio Fraga, que lembrou que as sociedades mais prósperas do planeta são as democracias. E também se pronunciou Beatriz Santos, da Coalizão Negra por Direitos, com a oportuna lembrança de que "enquanto houver racismo não haverá democracia".
Foram muitos os exemplos de diversidade.
Por todo o Brasil, a sociedade civil se fez ouvir, em vários manifestos contra os ataques à democracia.
Espera-se que tantos brados em favor da Constituição tenham chegado aos oficiais do topo das Forças Armadas. Mais: espera-se que tenham sabido interpretá-los.
Se não assistiram à íntegra do ato e quiserem recorrer a um resumo, uma boa sugestão é a fala emocionada da jovem Manuela Morais, presidente do Centro Acadêmico XI de Agosto.
Quase 60 anos depois do golpe de 1964, ela lançou ao público no fim de seu discurso uma frase surrada que seus pais e avós imaginavam nunca mais ser necessária, mas que deve soar como ordem unida tanto para civis quanto para militares:
"Ditadura nunca mais!".
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