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Chico Alves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonarismo deve ser arremessado para longe, como fez Leão Serva

Colunista do UOL

14/09/2022 10h35

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O gesto de Leão Serva, que ontem arrancou o celular da mão do deputado bolsonarista que assediava a jornalista Vera Magalhães e o arremessou longe, deveria ser motivo de profunda reflexão, especialmente por parte da Justiça e da imprensa. Conhecido por sua fala serena e comportamento cordial, Serva, que foi um dos mediadores do debate promovido por UOL, Folha de S. Paulo e TV Cultura, agiu de forma extremada porque identificou no ataque de Douglas Garcia a Vera uma situação-limite. A uma circunstância excepcional, respondeu com uma ação excepcional.

O parlamentar-delinquente que atacou a jornalista não é um personagem isolado. Basta lembrar que no último debate entre presidenciáveis foi o próprio Jair Bolsonaro quem lançou as ofensas contra ela. Garcia é apenas um entre tantos seguidores de Bolsonaro que usa o ódio para conquistar seguidores e eleitores.

Quatro anos depois de o bolsonarismo ter chegado ao poder no país, a democracia brasileira está também em uma situação-limite. É especialmente importante que jornalistas e magistrados entendam isso.

Desde que se tornou presidente, Bolsonaro estabeleceu clima de confronto entre os poderes, ampliou absurdamente o "toma lá, dá cá" no Congresso, reduziu drasticamente a transparência das ações do Estado, aparelhou as instituições que fiscalizam o governo e iniciou uma rotina de ataques à imprensa.

Infelizmente, nesses quase quatro anos de mandato o bolsonarismo vem sendo naturalizado, com o auxílio luxuoso de parte significativa da imprensa e do Judiciário.

Demorou a aparecer no noticiário a palavra "mentira" para definir as lorotas que o presidente despeja diariamente; a cobertura da agenda presidencial ainda serve para amplificar falas preconceituosas e ataques a adversários; personagens lamentáveis como Douglas Garcia, Carla Zambelli e Daniel Silveira (para citar apenas três de uma longa lista) são tratados com excessiva deferência e a falsa simetria que tenta igualar os bolsonaristas aos petistas continua em voga.

Nesse último item, não são poucos os jornalistas que seguem atribuindo à menção feita no passado por Luiz Inácio Lula da Silva a uma disputa de "nós contra eles" o mesmo peso que as barbaridades ditas por Bolsonaro, que chegou a falar em "fuzilar a petralhada". O presidenciável do PT deu explicação bastante plausível para o que disse na entrevista concedida ao Jornal Nacional: referia-se à polarização normal da política que acontece em vários países, como nos Estados Unidos e na Inglaterra, onde dois lados prevalecem.

Não se trata de santificar o petismo, mas equiparar alguns militantes mais agressivos do PT com trogloditas que praticam a violência diariamente incentivada por Bolsonaro - inclusive assassinando os oponentes - ou é má interpretação dos fatos ou medo de ser tachado como petista apenas por reportar a verdade.

Da parte do Judiciário, houve excessiva fé no "funcionamento das instituições". Os pontapés de Bolsonaro na Constituição foram tratados com enorme condescendência e sem que fossem usados os artifícios legais de que a Justiça dispõe para afastar os riscos à democracia.

O inquérito das fake news (que segundo o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, evitou o "descarrilamento institucional") e a busca e apreensão contra empresários que tramavam golpe em aplicativo de mensagens são as exceções que confirmam a regra. Iniciativas como essa deveriam ter sido mais frequentes.

Com quatro anos de contaminação da cena política pela agressividade bolsonarista, parasitas da democracia como o deputado Douglas Garcia se sentem à vontade para assediar jornalistas como Vera Magalhães, da mesma forma como figuras semelhantes a ele já atacaram as colegas Juliana Dal Piva, Patrícia Campos Mello e várias outras.

Não estamos em uma situação normal. Por isso, Leão Serva deixou de lado a serenidade habitual para agir com a firmeza que o momento exigia.
Que sirva de exemplo.

Em nome da democracia, temos que arremessar para longe o bolsonarismo, assim como foi lançado o celular do deputado.

O alerta clichê é inevitável: antes que seja tarde.