Topo

Chico Alves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Gestão Bolsonaro foi trágica para indígenas, mas Brasil nunca os tratou bem

Crianças Yanomami desnutridas pela inação do governo e a ação de garimpeiros - Urihi Associação Yanomami/Sumaúma Jornalismo
Crianças Yanomami desnutridas pela inação do governo e a ação de garimpeiros Imagem: Urihi Associação Yanomami/Sumaúma Jornalismo

Colunista do UOL

24/01/2023 16h25

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

É estarrecedor o nível de crueldade do governo de Jair Bolsonaro no trato com os indígenas, em especial no caso dos yanomami de Roraima. O ex-presidente permitiu a entrada de garimpeiros ilegais em suas terras, nada fez contra a contaminação por mercúrio nos rios e peixes, facilitou o avanço de bandos armados e reduziu as estruturas governamentais de saúde e segurança.

O resultado pode-se ver agora em detalhes, depois da visita do presidente Lula àquela comunidade. Quase 600 crianças mortas por subnutrição, adultos em estado crítico de saúde, falta de comida - já que as plantações estão contaminadas pelo mercúrio - e de medicamentos.

As fotos dos corpos esquálidos assombraram o Brasil e o mundo.

Bolsonaro e os asseclas que colaboraram para construir a tragédia dos yanomamis e de outros indígenas - Damares Alves, Ricardo Salles, Eduardo Pazuello - estão sendo agora responsabilizados pela parte da opinião pública que não está hipnotizada pelo bolsonarismo. Espera-se que respondam também na Justiça.

Ninguém se engane, porém: a vida dos povos originários não se transformará em paraíso daqui para a frente.

Como se sabe, esse tipo de forte comoção social não é duradouro. Em breve, aqueles que verteram lágrimas ao verem as fotos dos indígenas magérrimos retomarão seus interesses cotidianos e o país voltará a tratar dos assuntos rotineiros.

O campeonato de futebol, o BBB ou a polarização política retornarão ao rol de temas mais discutidos, onde o trato das comunidades indígenas nunca esteve.

Nas últimas décadas, quantos desses brasileiros foram assassinados a tiros ou por falta de recursos, distante dos olhos do brasileiro de outras regiões e da imprensa? Certamente, centenas.

Volta e meia algum caso trágico ou algum pedido de socorro mais forte atrai a atenção dos moradores do Sul ou Sudeste. De maneira geral, porém, são ignorados.

Há muitos anos, os indígenas e seus defensores morrem em silêncio perto de alguma árvore frondosa ou de uma roça de subsistência.

Não foi o bolsonarismo que inventou o abandono com que o Brasil trata os povos originários, apenas o exacerbou.

Para que a dignidade dessas comunidades seja restituída, não podemos nos contentar em criticar Bolsonaro e sua gangue.

Se esquecermos que antes deles a vida dos indígenas já era dramática, não haverá solução duradoura para esse problema.