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Constança Rezende

Gilmar prega união entre Poderes e pede maturidade contra o coronavírus

e Ana Carla Bermúdez, do UOL em Brasília e São Paulo

08/04/2020 18h16Atualizada em 08/04/2020 19h23

Resumo da notícia

  • Em entrevista ao UOL, ministro do STF afirma que Legislativo "tem dado exemplo de maturidade"
  • Gilmar critica Bolsoaro e diz que Constituição não permite que presidente adote políticas genocidas
  • Segundo ele, Mandetta vai conseguir atuar com liberdade, mas é preciso um "afinamento" entre Ministério da Saúde, Casa Civil e AGU
  • Para Gilmar, a busca de integração e de fim dos conflitos também ajudará a evitar a judicialização da pandemia

O ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), defendeu, nesta quarta-feira (8), em entrevista à colunista Constança Rezende, do UOL, que haja uma integração entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário no combate ao novo coronavírus.

Ele também criticou os choques recentes entre o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que tem manifestado divergências em relação à adoção de medidas de isolamento durante a pandemia, e disse que o governo não pode ter "políticas genocidas".

Gilmar afirmou que não esperava que a demissão de Mandetta fosse consumada — a saída dele foi cogitada no início da semana — e que uma eventual troca do ministro certamente não é desejável", disse Gilmar

O presidente dispõe do poder de exonerar seus ministros. [Mas] a Constituição não permite que o presidente adote políticas genocidas. Políticas que afetem de maneira crucial, global, a vida da população
ministro Gilmar Mendes, do STF

Gilmar elogiou o trabalho que vem sendo realizado pelo Parlamento — que, na avaliação dele, vem atuando de forma a dar o "exemplo de maturidade que tem faltado em outros setores muitas vezes" — e também por governadores e prefeitos na linha de frente contra a disseminação da covid-19.

"Acho que o Legislativo vem atuando de maneira bastante efetiva, não tem participado desse bate-cabeça da administração pública em geral, e se apresenta de forma mais organizada", disse o ministro.

Gilmar chegou a comparar o trabalho dos parlamentares brasileiros com o de uma "orquestra".

"Se olharmos os cerca de 600 parlamentares, aquilo está mais próximo de uma orquestra, algo bastante organizado, considerando que poderia ter as propostas mais mirabolantes e irresponsáveis nesse contexto", disse.

Ao comentar a ameaça de demissão do ministro da Saúde pelo presidente, Gilmar Mendes o ministro afirmou ser necessário que o "afinamento" seja atingido também entre Ministério da Saúde, Casa Civil e AGU (Advocacia-Geral da União).

"[É preciso] que haja um afinamento dessa orquestra. Que de fato o Ministério da Saúde, Casa Civil, AGU se articulem, porque todas elas são necessárias nesse momento. É fundamental a articulação".

Na avaliação do ministro, Mandetta vai conseguir trabalhar com liberdade mesmo após os embates recentes com o presidente.

Menos polarização, mais avaliação técnica

O ministro disse ainda ser preciso diminuir a "politização partidária" em torno do papel do isolamento no combate à disseminação da covid-19 e defendeu seguir a orientação de "técnicos".

"Vamos nos submeter às avaliações dos técnicos, fazer as avaliações considerando as nossas próprias limitações", disse. "Quando técnicos sugerem isolamento, é porque eles sabem que poderá haver um colapso no nosso sistema de UTI, como já ocorreu em outros países", declarou.

Gilmar afirmou também que, em conversa com Bolsonaro, disse ter recomendado a ele que encerre a "animosidade" com governadores. O presidente tem entrado em conflito aberto com governadores que têm adotado medidas contrárias às defendidas por ele. É o caso, por exemplo, do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que decretou quarentena e fechamento do comércio em todo o estado.

"Eu disse ao presidente: o senhor precisará dos governadores, independentemente da coloração partidária. A União não tem o poder de invadir um estado, de dar ordens, não é disso que se cuida", afirmou o ministro.

"O federalismo que está materializado no SUS é de cooperação. Por isso, creio que deveríamos encerrar essa animosidade, essa belicosidade, e buscarmos integração", completou.

Para o ministro do STF, o ideal neste momento de crise é tentar evitar a judicialização da pandemia.

"Quanto mais nós formos capazes de reduzir a conflituosidade, menor será a judicialização. Quanto maior legitimação tiverem os atos baixados pelo Executivo em consonância com estados e municípios, menor será a contestação e a judicialização. Todo o nosso esforço tem que ser nesse sentido, não judicializar e buscar consensos."

Outra ponderação feita por Gilmar Mendes foi quanto ao papel da Ministério da Justiça, chefiado pelo ex-juiz federal Sergio Moro, em meio à pandemia

Sem citar diretamente o titular da pasta, Gilmar disse que a área jurídica do governo federal está "ausente" nas discussões.

"Eu tenho sentido a ausência do Ministério da Justiça nesse debate. Temos controversas jurídicas, complexas, entre União, estados e municípios, conflitos que existem e são qualificados, e eu não tenho visto o Ministério da Justiça participar desse debate", disse o ministro do STF.

Gilmar, ainda sem mencionar o nome de Moro, disse que só tem ouvido comentário sobre a liberação de presos que fazem parte do grupo de risco da covid-19.

"No máximo eu tenho ouvido um muxoxo ou outro, comentário ou outro, sobre liberação de presos. Acho que o Ministério da Justiça, pela sua tradição, precisa se fazer presente nesse debate. Há questões jurídicas muito complexas."