Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Mistura explosiva: após mentiras sobre urnas, vêm aí 'fakes' sobre eleitos
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Depois de importar dos Estados Unidos as falsas narrativas que tentam colocar em xeque o sistema eleitoral, o Brasil trouxe da Colômbia nesta semana a máquina de produzir mentiras que buscam minar a imagem e a credibilidade de políticos democraticamente eleitos.
Ao contrário do que se viu nas redes sociais e nos aplicativos de mensagem do Brasil, o novo presidente da Colômbia, o esquerdista Gustavo Petro, não foi amigo do famoso narcotraficante Pablo Escobar. A foto que circulou pela internet não passa de uma tosca montagem já identificada e desmentida por dezenas de checadores. Petro também não foi membro das Forças Armadas da Colômbia (Farc). A imagem que viraliza, mostrando líderes da guerrilha com camisetas em seu apoio, não é real.
Mesmo assim, essas duas mentiras cruzaram as fronteiras, foram traduzidas para o português e são sinais claros de que nossos desinformadores —aqueles que traduziram para o Brasil os ataques feitos nos Estados Unidos contra a lisura da eleição de 2020—, agora aprendem com seus pares colombianos a destruir o perfil de políticos eleitos por meio da fabricação e difusão de notícias absurdas.
Para nós, que prezamos e lutamos pela verdade, o que sobra?
Primeiro saber que essas duas fábricas de mentiras existem e mostrar que elas já estão em ação. É fato, por exemplo, que, por conta dos constantes ataques ao sistema eleitoral brasileiro subiu de 17% (em março) para 24% (em maio) a porcentagem de brasileiros que não confiam nas urnas eletrônicas. Os números são do Datafolha.
Depois, é preciso estar disposto a verificar e corrigir notícias falsas que possam colocar em risco o resultado de uma eleição e a posse dos vencedores. Para tanto, não é preciso muito. Veja, por exemplo, o que aconteceu nesta semana com o presidente Jair Bolsonaro.
Na segunda-feira (20), ao falar sobre a vitória de Gustavo Petro na Colômbia, Bolsonaro disse — em tom crítico — que Petro tinha sido "um ex-guerrilheiro do Movimiento de Izquierda Revolucionaria (MIR)". Com uma simples busca na internet, é possível saber que este grupo, de tendência marxista-leninista, só atuou no Chile. Jamais fez ações na Colômbia de Petro.
Também é possível imaginar (e explicar por aí) o que levou o presidente a errar. Petro nunca foi do MIR, mas é fartamente criticado por seus opositores por ter feito parte do M-19 (Movimento 19 de abril), uma guerrilha urbana dissolvida na Colômbia na década de 90.
Para alguns, pode parecer bobagem o nome do movimento. Mas não é. Experimente confundir um palmeirense com um são-paulino (ou torcedores de quaisquer outros dois times), alegando que são todos torcedores de futebol, e veja o que acontece. Na política é igualzinho.
E o que fazer em casos mais graves?
Ao falar sobre Petro, Bolsonaro deliberadamente inventou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu principal rival na disputa pelo Palácio do Planalto, seguirá os passos anunciados por Gustavo Petro e soltará jovens detentos. Sua frase exata foi:
"O Lula vai soltar os menininhos que mataram alguém por um celular, para tomar uma cerveja".
Quem tem acesso à informação de qualidade não pode deixar de colocar alguns pingos nos is diante desse comentário de Bolsonaro. Deve dizer que a proposta de Petro não é bem essa. O novo presidente da Colômbia pediu à Procuradoria-Geral de seu país que solte jovens detidos em abril de 2021 por conta de protestos e greves. Celulares e cervejas ficam por conta de Bolsonaro
Além disso, é preciso dizer com alguma contundência que não há qualquer sinal de que, se vencer em outubro, Lula adotará medida semelhante no Brasil. Por ora, a frase de Bolsonaro não passa de ficção a la colombiana.
Cristina Tardáguila é diretora de programas do ICFJ e fundadora da Lupa
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