Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Guerra de narrativas sobre pandemia será transferida das redes para a CPI
A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da covid-19 no Senado — seja remota ou semipresencial, seja agora ou mais para frente, seja restrita ao governo federal ou ampliada para governadores e prefeitos — terá como efeito transferir a guerra de narrativas sobre a pandemia das redes sociais, onde não se chega a conclusão alguma, para as mãos de um grupo de senadores investidos com capacidade de investigação equivalentes ao de uma autoridade judicial.
Depoimentos poderão ser convocados, documentos confidenciais, requisitados, e sigilos bancários, quebrados.
O governo de Jair Bolsonaro, por meio da tropa de choque de senadores que serão indicados por sua base de apoio para compor a comissão, de tudo fará para, claro, primeiro, omitir os próprios erros e omissões, segundo, transferir responsabilidades para governadores e prefeitos, de preferência os que forem adversários políticos, e terceiro, repisar e replicar as crendices que embasam a postura de negligência do governo diante da pandemia.
Ou seja, quando o assunto forem medidas sanitárias que deixaram de ser adotadas em nível nacional, o discurso será o de que STF deu essa atribuição a estados e municípios e amarrou as mãos da União; quando o assunto forem os gastos milionários com dinheiro público para distribuição e a pressão para a prescrição de medicamentos sem eficácia comprovada contra a covid-19, o argumento será o de que mal não fez e que o Conselho Federal de Medicina (CFM) deu o seu (torto e interesseiro) endosso; quando o assunto for o boicote federal às vacinas, a justificativa será o contrário, de que não havia eficácia comprovada nos imunizantes ofertados e que desde sempre as compras estavam condicionadas à aprovação da Anvisa; quando inquiridos sobre aglomerações causadas por um presidente que sequer se dignava a usar máscaras, seus defensores na CPI dirão que as multidões se formaram espontaneamente graças à sua "grande popularidade" e que ele não temia a doença.
Enfim, haverá uma sequência de afirmações e argumentações feitas para confundir, desinformar, omitir e desviar-se do propósito investigativo.
Trata-se de um jogo que vai replicar o debate inócuo que ocorre nas redes sociais.
A diferença é que, com os instrumentos de uma CPI, será possível trazer fatos concretos à luz. Se bem analisados — e a sociedade poderá acompanhar isso de perto —, poderão levar a conclusões que nenhuma narrativa oca, sem embasamento, poderá derrotar. Reside aí o medo que Bolsonaro tem dessa CPI.
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