Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Sem imprensa vigilante, não existe democracia plena
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Comentei, na Live UOL de sexta-feira (23), a decisão da Justiça de Brasília, que, a pedido do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), censurou reportagens do UOL sobre o uso de dinheiro vivo na compra de 51 imóveis pela sua família.
A liminar - derrubada à noite pelo ministro do STF André Mendonça, o segundo indicado pelo próprio Jair Bolsonaro ao Supremo - foi concedida pelo desembargador Demetrius Gomes Cavalcanti, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.
Cavalcanti determinou que o portal retirasse do ar duas reportagens e postagens em suas redes sociais com menção ao assunto.
Várias autoridades reagiram ao atentado à liberdade de imprensa, e a determinação foi vista com preocupação pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo).
O desembargador alegou que as reportagens levantaram "suposições […] não submetidas ao crivo do Poder Judiciário".
Como comentou o jornalista Rubens Valente, alvo de outra espécie de censura no caso de Gilmar Mendes: "Essa eu não sabia. Para qual endereço os jornalistas devem mandar suas reportagens para o Judiciário antes da publicação?"
De fato, não existe liberdade de imprensa no país, se jornalistas são obrigados a submeter ao Poder Judiciário todas as informações que vão publicar. Sem uma imprensa vigilante, tampouco há democracia plena.
A confusão proposital entre questões processuais e fatos revelados por investigações policiais e jornalísticas não pode chegar ao cúmulo de legitimar a proibição de divulgação da verdade; mas bolsonaristas, lulistas e parte do Judiciário investem nessa confusão para apagar da história fatos que permanecem reais, independentemente do que decidiu a Justiça em processos específicos.
Flávio ainda agravou o quadro, espalhando nas redes sociais a mentira de que foi aceita uma queixa-crime contra os repórteres do UOL, quando, na verdade, o desembargador apenas determinou a realização de uma audiência para tentar a conciliação.
Ao derrubar a liminar, desmoralizando ainda mais o senador, Mendonça citou um julgamento de 2009 no STF que reiterou "a plena liberdade de imprensa como categoria jurídica proibitiva de qualquer tipo de censura".
Segundo o ministro, houve "ocorrência de aparente violação" àquela decisão do Supremo e "no Estado Democrático de Direito, deve ser assegurado aos brasileiros de todos os espectros político-ideológicos o amplo exercício da liberdade de expressão".
Mendonça ainda afirmou que "o cerceamento" da liberdade de expressão, "sob a modalidade de censura, a qualquer pretexto ou por melhores que sejam as intenções", não encontra guarida na Constituição.
"Entendo que, no presente momento processual, devem prevalecer as liberdades públicas, tanto a de informar quanto a de expressão em seu mais amplo sentido, as quais independem de censura ou licença."
A família Bolsonaro posa de defensora dessas liberdades, desde que elas não revelem sobre seus membros fatos incômodos que contrastam com sua propaganda. Se revelam, pede censura. Como a repercussão negativa da liminar acabou turbinando a repercussão das reportagens, porém, deveriam até agradecer a Mendonça pela contenção de danos.
Na Live UOL, falamos também sobre o discurso de Jair Bolsonaro (PL), em Minas Gerais, no qual o presidente voltou a afirmar que vai vencer a eleição no primeiro turno; e sobre o candidato bolsonarista ao governo de São Paulo, Tarcisio de Freitas (Republicanos), que ao ser questionado sobre seu local de votação, respondeu que vota "em um colégio".
Com Madeleine Lacsko, debato os principais assuntos do país diariamente, das 17h às 18h, com transmissão ao vivo nos perfis do UOL no YouTube, no Facebook e no Twitter.
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