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Fernanda Magnotta

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Após 2 meses de guerra, redesenho do território ucraniano parece inevitável

Bandeiras da Ucrânia e da Rússia, próximas a um carro-tanque de brinquedo, sobre um mapa da Europa. - Brasil Escola
Bandeiras da Ucrânia e da Rússia, próximas a um carro-tanque de brinquedo, sobre um mapa da Europa. Imagem: Brasil Escola

Colunista do UOL

24/04/2022 09h08

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Após 2 meses da invasão russa à Ucrânia, o futuro dessa guerra segue incerto. Sabemos que as demandas do Kremlin foram reduzidas com o passar do tempo e que houve mudança de orientação militar no campo de batalha. Apesar disso, é precipitado tomar como certas as razões que explicam esses movimentos e, a partir daí, presumir o que vem pela frente.

Hoje, pouco se fala em uma transição de poder na Ucrânia, com a substituição ou não reconhecimento do presidente Volodymyr Zelensky como líder no comando, por exemplo, ou sobre a adesão da Ucrânia na União Europeia. Embora obviamente interesse a Moscou fortalecer grupos pró-Rússia no país e manter a Ucrânia dentro de sua própria esfera de influência, a pauta está, nesse momento, centrada na contenção dos avanços da OTAN rumo do Oriente e na tentativa de desmilitarização do país, com a renúncia imediata de certos territórios.

Ao mesmo tempo em que o escopo das negociações foi sendo limitado nas conversas diplomáticas, também no campo de batalha acompanhamos alterações de rota. Os russos não tomaram Kiev, como pareciam almejar desde o princípio da guerra. Recuaram também em várias outras cidades importantes da Ucrânia. No lugar disso, passaram a se concentrar, nas últimas semanas, em uma porção muito mais circunscrita do território daquele país.

Generais russos declararam recentemente que almejam, nessa guerra, o controle completo do Donbas e do sul da Ucrânia. Buscam, portanto, maior coordenação terra-ar e um estrangulamento a partir do leste. Não à toa, Mariupol totalmente ocupada representa o símbolo dessa divisão do território ucraniano. A cidade é fundamental para assegurar um corredor terrestre entre a Crimeia e Donbas e tem saída para o Mar de Azov, parte do Mar Negro.

Teria sido parte da estratégia russa manter uma ofensiva inicialmente descentralizada apenas para moldar o ambiente e enquadrar as negociações, expandindo seu campo de barganha ao máximo para depois concentrar esforços no que realmente lhes convém? Ou o que assistimos agora é mesmo um rearranjo fruto da necessidade de reduzir ambições no campo de batalha haja vista a dificuldade de Moscou em avançar com os próprios planos? Difícil dizer.

Sabemos que na Guerra da Ucrânia, a imprevisibilidade é parte do jogo. O que parece cada vez mais claro, no entanto, é que dificilmente o encerramento do conflito no leste europeu escapará de uma discussão sobre os contornos fronteiriços da Ucrânia.

Passados dois meses do início do conflito, parece plausível, nesse momento, assumir que o futuro das negociações deverá envolver ao menos um dos seguintes cenários: 1) uma saída a partir da divisão da Ucrânia em dois Estados, um sob o comando do Kiev, que inclui boa parte do espaço geográfico atual do país, e outro independente, que funcione como tampão ou cinturão de proteção dos interesses russos - esse liderado pelos separatistas pró-Moscou, com extensão da região agora ocupada; 2) uma saída por meio do achatamento do atual território ucraniano via incorporação da porção leste do território pela própria Rússia, o que expandiria formalmente o desenho de fronteiras desse país e reduziria a dimensão da atual área da Ucrânia.

Em nenhum dos dois casos temos mar calmo pela frente.