Fernanda Magnotta

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Opinião

Condenado, discurso de Trump ameaça sistema de freios e contrapesos nos EUA

Ontem, Donald Trump entrou para a história norte-americana como o primeiro presidente dos Estados Unidos a ser condenado por um crime. Ele foi considerado culpado no primeiro dos quatro julgamentos que enfrentará. Isso ocorreu a partir de uma decisão, por unanimidade, em relação a todas as 34 acusações que sofria, a partir de um júri composto por 12 cidadãos de Nova York.

Da decisão ainda cabe recurso, que deve ser prontamente encaminhado pela equipe de advogados do ex-presidente. Enquanto isso, em 11 de julho, espera-se que o juiz do caso defina a pena a ser cumprida. Juristas ponderam que o ex-presidente poderia ser preso por até 4 anos, mas a maior parte deles, avalia que é improvável que a sentença vá nessa direção, inclusive pelo fato de que Trump é réu primário.

Sabemos que as eleições de novembro serão, na prática, definidas em 5 ou 6 estados do país e que terão seus resultados pautados com base em dois critérios principais: maior rejeição a um candidato e maior engajamento/comparecimento de cada eleitorado para votar. Isso faz com que cada novidade até lá seja considerada relevante.

Ainda assim, não está claro como esse veredito recente afetará a candidatura de Trump e os resultados das eleições presidenciais. A situação é de tamanho ineditismo que a falta de precedentes dificulta o mapeamento das implicações jurídicas e políticas.

Também, do ponto de vista da opinião pública, os efeitos parecem incertos. A base trumpista dificilmente abandonará seu líder. Ao contrário, deve radicalizar-se ainda mais, encampando o discurso de que se trata de uma perseguição "do sistema" contra ele. Sobre os republicanos menos entusiastas, e os votantes independentes, as pesquisas ainda parecem pouco consistentes.

Algumas delas, sugerem que é possível que parte significativa desse eleitorado possa desistir de apoiar um candidato condenado pela Justiça, o que poderia minar as chances de vitória republicana em estados-chaves, onde as margens são estreitas. Em outras, no entanto, há indicações de que boa parte dos cidadãos dos Estados Unidos são pouco sensíveis aos problemas jurídicos de Trump no contexto de uma disputa com Biden.

Ao deixar o tribunal nesta quinta-feira, Trump voltou a reforçar a narrativa que já adota desde o início do processo: disse estar sendo vítima de perseguição política, criticou o juiz do caso, e sugeriu que a decisão teria sido um feito da administração Biden para ferir um oponente. Nada disso procede. Esse processo em específico repousa sobre uma série de provas materiais, amplamente documentadas, e foi analisada por um júri popular independente. Tampouco tem qualquer relação com o poder federal ou com a jurisdição de Washington DC.

O que mais chamou a atenção no discurso do ex-presidente, no entanto, foi o trecho em que ele afirmou que o "verdadeiro veredito será em 5 de novembro pelo povo", fazendo referência ao dia das eleições nacionais.

Ao dizer isso, Trump despreza as competências do judiciário norte-americano, ignora a Constituição do país, a estrutura tripartite de poder que ela impõe, e reduz o sistema político dos Estados Unidos a um modelo plebiscitário populista rudimentar e propenso a arroubos autoritários.

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Se abraçar a narrativa de Trump nesse momento, o Partido Republicano enterrará a sistema de freios e contrapesos do país e, com isso, jogará uma pá de cal sobre parte do que produziu como legado para o Ocidente a Revolução Americana, em 1776.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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