Debate sobre Amazônia escancara tensão e grupos inimigos dentro do Vaticano
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Terminado o Sínodo da Amazônia, fontes dentro da Santa Sé revelam que o mergulho na realidade da floresta teve um outro impacto: o de escancarar a tensão dentro do Vaticano entre os aliados de um papa progressista e uma minoria insatisfeita com o debate e mesmo com o perfil das pessoas que passaram a frequentar os corredores do local.
Não era segredo para ninguém que, desde sua escolha, Jorge Bergoglio passou a ser alvo de questionamentos por suas atitudes. Foi chamado de "palhaço" pelos ultraconservadores e alvo de ataques públicos por teólogos alinhados à extrema-direita. Ao questionar o sistema econômica, foi ainda classificado de "comunista".
Neste fim de semana, algumas das propostas aprovadas pelos bispos chacoalharam a praça São Pedro: a avaliação de uma eventual participação das mulheres na liturgia, a criação de um pecado ecológico e a possibilidade de que homens casados possam ser ordenados padres. Tudo isso para que a Igreja volte a ter um papel na Amazônia.
Se não bastasse, a presença de pessoas de pele escura, com outras tradições e vestimentas pelas salas do Vaticano deixaram os mais conservadores incomodados, e a crise ainda mais explícita. Na semana passada, uma estátua indígena que representava a fertilidade e que fora usada numa igreja de Roma ainda foi roubada e jogada num rio. A suspeita é de que o ato tenha sido cometido por grupos católicos que acreditam que as imagens estariam ferindo os ritos da religião.
No fim de semana, o papa Francisco se pronunciou. E mandou seu recado direto, sem insinuações. O argentino deixou claro que não aceitará ser "prisioneiro de um seleto grupo", classificando seus adversários de "elite católica".
Para questionar esse grupo, o papa citou os trabalhos de Charles Péguy que, há um século, escreveu "Nota Conjunta sobre Descartes e Filosofia Cartesiana".
"Porque lhes falta a coragem de assumir assuntos terrenos, eles acreditam que estão assumindo os de Deus. Porque têm medo de fazer parte da humanidade, pensam que são parte de Deus. Porque não amam ninguém, iludem-se pensando que amam a Deus".
Segundo o papa, essa elite tentou impor seus interesses pessoais no Sínodo e "esqueceu o diagnóstico que fizemos". Para o pontífice, "pequenos grupos elitistas" tentaram afirmar sua visão, se concentrando em "detalhes".
Bergoglio deixou claro ainda que não vê a manutenção da tradição como um valor em si mesmo.
"Algumas pessoas pensam que a tradição é um museu, algo antigo. Gosto de dizer, no entanto, que a tradição é a preservação do futuro, não o cuidado das cinzas. É como as raízes através das quais a seiva faz a árvore crescer para dar frutos."
Nos próximos meses, Francisco irá se pronunciar sobre as recomendações do Sínodo. Mas, de acordo com fontes de alto escalão em Roma, o evento criou um ambiente de clara rivalidade por parte da ala mais conservadora e que tentará pressionar a Cúria. "No fundo, o que vemos já é um posicionamento de muitos, pensando no próximo Conclave", alertou um experiente interlocutor dentro da Santa Sé.
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