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Ex-diretor da Petrobras levou milhões para Suíça pós eclosão da Lava Jato

Michael Lauber, procurador-geral da Suíça - Reprodução
Michael Lauber, procurador-geral da Suíça Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

20/02/2020 04h00

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O ex-diretor da Petrobras, Pedro José Barusco Filho, retirou dinheiro do Brasil e transferiu para contas secretas na Suíça, dias depois que a Operação Lava Jato eclodiu, em 2014. As informações fazem parte do ato de acusação contra o brasileiro Bernardo Freiburghaus, que será julgado na Suíça no final do mês. Trata-se do primeiro caso envolvendo a Lava Jato que chegará aos tribunais suíços.

O operador deixou o Brasil naquele ano e, por contar com nacionalidade suíça, evitou ser preso no país. Ao longo dos anos, Freiburghaus passou a cooperar com as investigações no Ministério Público em Berna, ajudando os procuradores a decifrar a trilha do dinheiro da corrupção.

Ele ainda fechou um acordo, em que reconhece os crimes e dá detalhes de como foram os dias que mudaram a história política do Brasil. Em 2014, em conversa com o autor dessa coluna em Genebra, o operador afirmou que a imprensa brasileira estava sendo enganada pelos procuradores e que não existia prova de nada. Seis anos depois, ele afirma nos documentos oficiais um sentimento de "arrependimento".

No ato de acusação, um dos episódios relatados se refere à tentativa dos ex-dirigentes da Petrobras de levar, às pressas, dinheiro para contas na Suíça. Barusco esteve no país europeu entre o final de fevereiro e março de 2014. Freiburghaus o acompanhou em visitas a cinco bancos.

"Após o seu retorno ao Brasil, o caso Lava Jato eclodiu, especialmente uma prisão do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, no dia 20 de março de 2014", explica o documento da Justiça suíça. "Nos dias que se seguiram, Barusco Filho foi até o escritório de Freiburghaus no Rio de Janeiro para depositar a uma quantia de US$ 1,95 milhão, que ele escondia em dinheiro e em diversas moedas", explicou.

"Ele indicou que havia levado o dinheiro, por medo de que fosse descoberto em sua casa em uma eventual operação", disse. Barusco pediu que o operador enviasse os recursos para uma conta sua na Suíça, com o objetivo de esconder o dinheiro da Justiça.

De acordo com o ato de acusação, Freiburghaus entrou em contato com pessoas que montariam um esquema. O objetivo: garantir que o envio não deixasse rastro de documentos.

Por meio de operações de compensação, o dinheiro foi enviado para a Suíça entre março e maio de 2014. O banco escolhido era o Cramer &Cia, em Lugano, que recebeu os valores em três depósitos.

O operador, diante dos procuradores suíços, reconheceu que sabia que os recursos eram de origem criminosa e que estava operando "às margens da lei". O dinheiro, durante a delação de Barusco, acabou sendo devolvido aos cofres brasileiros.

Procuradores em Berna - Jamil Chade - Jamil Chade
Procuradores suíços que lideram investigações sobre corrupção no Brasil
Imagem: Jamil Chade


Ciência da lavagem

A forma pela qual a transferência foi realizada e as camadas criadas por Freiburghaus para fazer a origem do dinheiro "desaparecer" revelaram aos suíços a sofisticada operação de lavagem de dinheiro que existia entre o Brasil e a Suíça.

No total, Freiburghaus administrava ou operava 21 contas bancárias na Suíça, cujos reais donos eram os ex-diretores da Petrobras e que eram alimentadas por dinheiro de propinas, principalmente da Odebrecht.

Entre 2007 e 2014, ele permitiu o trânsito de US$ 60 milhões, em contas em bancos como Pictet.

A operação exigia ainda várias reuniões com os reais donos do dinheiro. Apenas com Barusco, Freiburghaus informou que mantinha entre 15 a 20 reuniões por ano.

Em alguns casos, o operador deu explicações aos bancos que sabia não ser verdade. Numa transferência ao banco PKB, em Lugano, Freiburghaus indicou que Paulo Roberto Costa estava recebendo os recursos por conta da venda de imóveis e economias que tinha feito.

Mas o ato de acusação também revela como Freiburghaus telefonou para bancos suíços em abril de 2014, depois da eclosão da Lava Jato, para alertar os gerentes de contas a não receber o dinheiro que Barusco queria transferir. O temor do operador era de que fosse considerado como cúmplice, já que o escândalo já era público.

Em novembro de 2014, Barusco fechou um acordo de delação premiada no Brasil. Ele foi condenado a 15 anos de prisão, convertidos em pena semi-aberta. Ele ainda devolveu US$ 97 milhões aos cofres públicos.