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Jamil Chade

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Covid-19 deixa milhões sem saúde; Continente americano é mais afetado

Vacinação de indígenas da aldeia Umuriaçu, próximo a Tabatinga, Amazonas - Marcelo Camargo/Agência Brasil
Vacinação de indígenas da aldeia Umuriaçu, próximo a Tabatinga, Amazonas Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Colunista do UOL

26/04/2021 12h00

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Resumo da notícia

  • 228 milhões de pessoas foram afetadas no mundo por suspensão de programas de vacinação em 50 países
  • Acesso à saúde foi profundamente afetado durante o primeiro ano da pandemia, com apenas 6% dos países apontando que serviços permaneceram intactos

Um levantamento realizado pela OMS e Unicef revela que, um ano depois da pandemia da covid-19 ter iniciado, dezenas de campanhas de vacinação pelo mundo contra outras doenças estão sendo afetadas, suspensas ou adiadas, colocando em risco milhões de crianças. Além disso, inúmeros programas de saúde mental, pré-natal, HIV, tuberculose e tratamentos foram abalados.

O resultado é a constatação de que milhões de pessoas pelo mundo ficaram sem acesso à saúde básica, com implicações que podem levar anos para ser revertidas. O levantamento também revela que o continente americano foi o que mais sofreu com a interrupção ou abalo em seus serviços públicos de saúde durante a pandemia.

Dos 135 países avaliados, entre eles o Brasil, 94% indicaram que serviços essenciais de saúde foram afetados no primeiro ano da pandemia. Saúde primária, reabilitações e cuidados de longa duração foram os mais impactados, com 40% dos países indicando problemas importantes.

Cirurgias, mesmo sobre casos emergenciais, continuam sendo impactadas em 20% dos países. Em 66% dos locais avaliados, cirurgias e intervenções não emergenciais foram afetadas. 


Ainda que a situação seja um pouco melhor que a OMS registrou há seis meses, 34% dos países indicaram que metade de seus serviços de saúde foi afetado pela pandemia. Em 10% dos países, o impacto chegou a variar entre 75% e 100% dos casos.

Apenas 6% dos países no mundo indicaram que conseguiram manter o restante de seus serviços de saúde intactos durante a pandemia.

Américas é região mais afetada

O levantamento não revela o nome dos países. Mas o que a OMS ainda constata é que as Américas foi a região mais afetada. 65% dos serviços foram de alguma forma interrompidos ou abalados. 41% dos serviços de saúde para mulheres e de nutrição foram afetados. 55% dos países na região indicaram que campanhas de vacinação sofreram problemas. Serviços para combater transmissível foram afetados em 49% deles e 60% de programas de saúde mental foram impactados.

"Os serviços mais frequentemente perturbados foram os serviços de planeamento familiar e contracepção e a gestão de desnutrição moderada e grave, ambos perturbados em mais de 40% dos países declarantes", disse o informe da OMS.

"Um terço dos países também comunicou perturbações nos cuidados pré e pós-natais, que são serviços de saúde críticos para assegurar que as mulheres grávidas e recém-nascidos sobrevivam e permaneçam saudáveis", apontou.

Motivos

De acordo com a OMS, a disponibilidade insuficiente de pessoal tem sido a causa mais apontada como motivo para a interrupção de outros serviços de saúde. 66% dos 112 países que deram respostas à pergunta indicaram nesse sentido. Mas o cancelamento de cuidados não emergenciais foi citado por 47% dos governos, além de falta de equipamento de proteção pessoal (26%). 


Outro motivo identificado foi uma transformação na relação da população com os serviços de saúde. Em 57% dos países, o medo e desconfiança da comunidade na procura de cuidados de saúde foram citados como razões para a crise não declarada na saúde. Em quase metade dos países, as dificuldades financeiras da população foram citadas.

Imunização é perturbada e afeta milhões

Os dados estão sendo publicados no momento em que entidades internacionais anunciam uma estratégia para tentar salvar 50 milhões de pessoas, graças às vacinas, até 2030. Mas alertam que 37% dos países indicaram que campanhas de imunização que eram regulares antes da pandemia foram impactadas.

De acordo com o levantamento, 60 campanhas de imunização foram adiadas em 50 países, colocando cerca de 228 milhões de pessoas - na sua maioria crianças - em risco de doenças como o sarampo, a febre amarela e a poliomielite. Mais de metade dos 50 países afectados encontram-se em África, salientando desigualdades prolongadas no acesso das pessoas a serviços de imunização críticos.

De acordo com a OMS, as campanhas de imunização contra o sarampo, que é uma das doenças mais contagiosas e pode resultar em grandes surtos onde as pessoas não são vacinadas, são as mais afectadas. 23 delas foram adiadas, afetando cerca de 140 milhões de pessoas.

"Mesmo antes da pandemia, havia sinais preocupantes de que estávamos começando a perder terreno na luta contra doenças infantis evitáveis, com 20 milhões de crianças já a faltar a vacinações críticas", disse Henrietta Fore, diretora-executiva da UNICEF.

"A pandemia agravou uma má situação, fazendo com que mais milhões de crianças ficassem sem imunização", disse.

Como resultado da falta de campanhas, foram registrados surtos graves de sarampo em países como a República Democrática do Congo, Paquistão e Iêmen.
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"É provável que milhões de crianças em todo o mundo percam as vacinas básicas, uma vez que a atual pandemia ameaça desfazer duas décadas de progresso na imunização de rotina", disse Seth Berkley, CEO da Gavi, a Aliança de Vacinas.

"Para apoiar a recuperação da COVID-19 e para combater futuras pandemias, teremos de assegurar que a imunização de rotina seja priorizada, uma vez que também nos concentramos em alcançar crianças que não recebem nenhuma vacina de rotina,", disse.

Na esperança de reverter esse cenário, as entidades lançam nesta segunda-feira um plano para evitar cerca de 50 milhões de mortes até 2030. 75% delas em países de baixo e médio-baixo rendimento.

Para isso, terão de atingir uma cobertura de 90% para vacinas essenciais administradas na infância e adolescência, reduzir para metade o número de crianças completamente desprovidas de vacinas, completar 500 programas nacionais ou subnacionais de vacinação.

"Os líderes mundiais e a comunidade mundial de saúde e desenvolvimento devem assumir compromissos explícitos e investir em sistemas de imunização mais fortes, com abordagens adaptadas aos países frágeis e afetados por conflitos", defendem as entidades.