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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Brasil estuda visto humanitário para afegãos

17.ago.2021 - Área externa do Aeroporto Internacional de Cabul, no Afeganistão - REUTERS
17.ago.2021 - Área externa do Aeroporto Internacional de Cabul, no Afeganistão Imagem: REUTERS

Colunista do UOL

18/08/2021 13h32

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O governo brasileiro poderá anunciar uma iniciativa para acolher afegãos que estejam em situação de extrema vulnerabilidade. Fontes no Itamaraty confirmaram à coluna que o governo considera o estabelecimento de uma espécie de visto humanitário, para um número específico de pessoas.

Em sua primeira declaração pública sobre a crise, ainda na segunda-feira, o Itamaraty insistiu sobre a situação dos direitos humanos. Nesta quarta-feira, o governo ainda assinou uma declaração conjunta com Europa e EUA afirmando estar "profundamente preocupado" com as condições de mulheres e meninas. Para a próxima semana, o Brasil irá patrocinar uma reunião de emergência do Conselho de Direitos Humanos da ONU sobre o tema.

Desde a queda do governo do Afeganistão e a tomada do poder por parte do Taleban, a ONU passou a se mobilizar na busca de parceiros que possam garantir o acesso de afegãos. Aliado do grupo fundamentalista, o Paquistão mantém suas fronteiras fechadas, ainda que conte com um número expressivo de refugiados afegãos que cruzaram as fronteiras nos últimos anos.

De acordo com a ONU, quase 600 mil pessoas já tiveram de deixar suas cidades e residências desde o começo de 2021, buscando proteção dentro do próprio Afeganistão. Mas as entidades internacionais insistem que a comunidade internacional precisa se preparar para um eventual êxodo.

Dentro da organização, as imagens do desespero de afegãos buscando formas de embarcar em aviões foram consideradas como um sinal de que o potencial fluxo migratório pode se transformar em realidade em poucos dias.

Outro aspecto sob negociação é o resgate de milhares de afegãos que serviram as tropas americanas e europeias. Essas pessoas, hoje, são consideradas como potenciais alvos de retaliações por parte do Taleban, por terem "traído" os valores locais. Cerca de 30 mil pessoas poderiam estar nessa categoria, além de jornalistas e ativistas de direitos humanos que também seriam alvo de uma possível repressão.

Intelectuais afegãos vêm insistindo, nos últimos dias, que é uma "obrigação moral" dos EUA resgatar essas pessoas, da mesma forma que os americanos fizeram em 1975 ao deixar Saigon com os vietnamitas.

O governo de Joe Biden já anunciou um pacote de US$ 500 milhões para planejar a chegada de pessoas evacuadas do Afeganistão. Já a Europa, ainda sob a polêmica do fluxo de refugiados sírios em 2015 e 2016, avalia de que forma poderá coordenar uma resposta que não represente uma pressão sobre suas fronteiras. Uma das ideias é a de incrementar a ajudar humanitária para que os afegãos não deixem suas regiões ou países asiáticos.

Alguns governos também indicaram que estão dispostos a receber uma parcela dos refugiados. Uganda, por exemplo, anunciou que irá acolher 2 mil afegãos.

Enquanto o governo brasileiro avalia o caminho a ser adotado, a bancada do PSOL na Câmara dos Deputados enviou um requerimento ao Itamaraty e ao Conselho Nacional de Refugiados para pedir que o Brasil assuma uma postura no sentido de ajudar a população afegã.

No pedido, o documento assinado pela deputada Talíria Petrone e outras parlamentares do PSOL recomenda que o Conare "permita a concessão, por razões humanitárias, de visto apropriado, em conformidade com a Lei nº 2 13.455, de 24 de maio de 2017, a pessoas afetadas pela situação de grave e generalizada violação aos direitos humanos no Afeganistão".

O PSOL também solicita que o Ministério das Relações Exteriores faça "esforços de coordenação com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados e países terceiros de modo a viabilizar voos humanitários dos países fronteiriços ao Afeganistão, viabilizando a vinda das pessoas afetadas pela situação de grave e generalizada violação aos direitos humanos naquele país.

Acesso à saúde

A questão sanitária também preocupa a comunidade internacional. Num comunicado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou estar "empenhada em permanecer no Afeganistão e prestar serviços de saúde críticos e apela a todas as partes para que respeitem e protejam os civis, os trabalhadores da saúde, os pacientes e as instalações de saúde".

"O acesso sustentado à assistência humanitária, incluindo serviços de saúde essenciais e suprimentos médicos, é uma linha de vida crítica para milhões de afegãos, e não deve ser interrompido", defendeu a OMS.,

A entidade destaca que, como resultado do recente conflito, os ferimentos por trauma aumentaram, exigindo o incremento dos serviços médicos e cirúrgicos de emergência. "Em julho de 2021, cerca de 13 897 casos de trauma relacionados ao conflito foram recebidos em 70 instalações de saúde apoiadas pela OMS, em comparação com 4057 casos em julho de 2020", constatou a agência.

A OMS explicou que começou a fazer uma avaliação inicial das necessidades de saúde das populações deslocadas. Entretanto, as intervenções foram suspensas devido à insegurança.

"Em áreas onde as pessoas fugiram para buscar segurança e abrigo, incluindo Cabul e outras grandes cidades, relatórios de campo indicam que há casos crescentes de diarreia, desnutrição, pressão alta, sintomas de covid-19 e complicações de saúde reprodutiva", apontou a agência.

Além disso, os ataques aos profissionais de saúde continuam sendo um grande desafio." De janeiro a julho de 2021, 26 estabelecimentos de saúde e 31 profissionais de saúde foram afetados; 12 profissionais de saúde foram mortos", disse a OMS.

"O povo do Afeganistão precisa hoje, mais do que nunca, de apoio e solidariedade. Os ganhos dos últimos 20 anos não podem ser revertidos", completou a agência.