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Governo adota negacionismo sobre desaparecidos e cria mal-estar na ONU
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Numa reunião marcada por um mal-estar, o governo de Jair Bolsonaro adotou uma postura negacionista sobre a situação dos desaparecidos forçados no Brasil, alegando que não se trata de um problema de grandes proporções. As autoridades ainda indicaram que temas relacionados com o período do regime militar não eram de escopo dos acordos internacionais assinados pelo Brasil que estavam sendo examinados, além de questionar e tentar desqualificar as informações prestadas pela sociedade civil.
Nesta semana, pela primeira vez, um Comitê da ONU iniciou um exame sobre a situação do desaparecimento forçados no Brasil, colocando pressão sobre o país em temas como a violência policial, milícias e mesmo sobre a forma pela qual o governo lida com as vítimas da ditadura (1964-1985).
Enquanto os membros do Comitê insistiam em entender a dimensão sobre a situação no Brasil, o tom usado pelo governo foi o de minimizar o tamanho do problema e, ao mesmo tempo, apontar que não contam com números.
Alban Alencastro, perito do Comitê, deixou claro que a postura do governo se contrasta com levantamentos de entidades internacionais. O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), por exemplo, indica que foram 62.857 registros de desaparecimentos no ano de 2020, acompanhados de um número de 31.996 de pessoas localizadas. «Os dados são alarmantes», apontou Alencastro.
Na reunião, porém, o governo se concentrou em apresentar informações sobre a estrutura das instituições brasileiros, elogiar iniciativas adotadas pelo governo, treinamentos e projetos de criar aplicativos.
Mas a atitude da delegação brasileira surpreendeu representantes da sociedade civil e membros do Comitê da ONU.
Chamou a atenção, acima de tudo, o comentário e comportamento do diplomata brasileiro, Patrick Mallmann, que foi recebido como um sinal preocupante em Genebra. Para ele, que atua como assessor da ministra Damares Alves, os desaparecimentos forçados são apenas "eventuais" no momento no Brasil.
Matar Diop, membro do Comitê, se queixou do fato de que o governo não prestou as respostas solicitadas. Uma delas se referia ao envolvimento entre milícias e agentes do estado, ignorada pelo governo durante a sabatina.
Alencastro também lamentou não ter respostas a suas perguntas e lembrou de casos de mortes e desaparecimentos em prisões. O governo rejeitou que seus dados sejam completos sobre a situação dos motins nos centros de detenção.
Um momento de mal-estar ainda foi protagonizado quando Mallmann retomou a palavra e, num tom indignado, alegou que alguns pontos levantados pelo Comitê seriam "inaceitáveis" e chegou a indicar que algumas acusações eram "absurdas". O tom fugiu do protocolo adotado nos exames de governos.
Ele ainda se queixou de perguntas do Comitê, ironizou comentários e deixou claro que não iria responder a perguntas que ele acreditava estar fora do mandato da ONU.
"Estamos tratando de Brasil", disse o diplomata, numa fala que insistia sobre a solidez do estado de direito no país e dando a entender que certas perguntas não tinham lugar.
O diplomata ainda questionou a credibilidade das fontes de informações usadas pela ONU para questionar o Brasil. "Não tem base nenhuma", disse, numa das perguntas, sobre a existência de valas clandestinas. Para ele, os comissários da entidade não estão sendo bem auxiliados.
A coluna apurou que os especialistas internacionais receberam dezenas de páginas de documentos e informações por parte de entidades como a Comissão Arns, Instituto Vladimir Herzog, Conectas Direitos Humanos e várias outras.
Para completar, o diplomata se queixou de um suposto comportamento do Comitê de tratar o Brasil como um estado que traz desinformação.
Mas a relatora do Comitê, Milica Kolakovic-Bojovic, não ficou satisfeita em certos aspectos e chegou a "lamentou" pelo menos uma das posturas legais do país.
Ao concluir o debate, ela concordou que o Brasil era "grande e bonito". "Mas em direitos humanos, tratados todos iguais", disse. Ela também lembrou que todas as informações prestadas pela sociedade civil para a ONU estavam em documentos que eram públicos.
Mas o diplomata brasileiro não se deu por satisfeito. Ao tomar uma vez mais a palavra, alertou que os dados prestados pela sociedade civil eram de "terrível qualidade" e que o governo não poderia responder "sobre coisas que não ocorreram".
A partir das respostas do Brasil, o Comitê agora examinará a situação do país e, na próxima semana, apresentará suas conclusões. Entre elas, os especialistas internacionais irão ainda fazer recomendações ao estado brasileiro.
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