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Divididos após 2 anos de covid, países buscam pacto contra futura pandemia
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Resumo da notícia
- Governo brasileiro anunciou que quer fazer parte do órgão que irá negociar o novo acordo internacional
- Processo irá durar até 2024
Dois anos depois da eclosão da pior pandemia em cem anos, o mundo continua dividido sobre como responder à crise sanitária. Nesta segunda-feira (29), governos de todo o mundo se reúnem na OMS (Organização Mundial da saúde) e aprovarão um processo para criar um pacto internacional estabelecendo regras sobre como lidar com futuras pandemias.
O governo brasileiro anunciou que quer fazer parte do órgão que irá negociar o novo pacto. Mas, com a comunidade internacional rachada profundamente e com milhões de vítimas espalhadas pelos continentes, o acordo promete escancarar a dificuldade de se construir uma estratégia comum contra a covid-19.
Se o apelo inicial da OMS era por um acordo que pudesse ser costurado em seis meses, o novo projeto não deve estar concluído antes de 2024.
Apoiado por Brasil, EUA, Europa e mais de uma centena de países, a negociação tem como meta estabelecer um tratado internacional que estipulará as obrigações e direitos de cada governo diante de um novo surto.
No texto que será aprovado em Genebra, governos deixam aberta a possibilidade de que o novo acordo seja legalmente vinculante, o que obrigaria a todos a implementá-lo.
Mas o acordo que será celebrado nesta semana e anunciado como um passo importante esconde profundas divisões entre países e um mal-estar diante da decisão de governos de impor restrições contra países africanos que compartilharam a informação sobre a nova mutação do vírus.
Não existe, por exemplo, um entendimento de como deveria ser um futuro acordo no que se refere à transferência de tecnologias para a produção de vacinas e remédios. Governos ainda vivem um impasse diante do apelo de sul-africanos e indianos por uma suspensão de patentes.
Mas, do lado das grandes farmacêuticas, o temor é de que o compartilhamento de tecnologia ou a quebra de patentes permitam que a inovação do método mRNA acabe saindo do controle de um pequeno número de empresas multinacionais. O foco desse grupo não é a pandemia da covid-19, mas as promessas de que a tecnologia possa oferecer caminhos para imunizantes contra Ebola, HIV e até o câncer.
Apesar disso, no processo negociador que será lançado, governos de países ricos querem garantias de que todos os integrantes do pacto se comprometerão a compartilhar amostras biológicas. Para os emergentes, sem uma contrapartida, esse compartilhamento pode ser desequilibrado.
De um lado, esses governos oferecerem transparência. Mas, quando tiverem de ter acesso aos tratamentos, terão de entrar na fila e ameaçam ser os últimos a receber.
Tampouco existe um acordo sobre a distribuição de vacinas. A OMS insiste que todas as promessas feitas até agora pelos países ricos foram insuficientes e que jamais foram completamente implementadas. No início de novembro, em Roma, a cúpula do G-20 estabeleceu uma estratégia para garantir que 40% da população de cada país estarão imunizados até o final do ano e que essa taxa chegaria a 70% em meados de 2022.
Mas Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, não escondia a desconfiança. "O acordo é importante. Mas será suficiente? O que eles precisam é entregar essas vacinas", disse ao UOL.
Hoje, pelo menos 40 países pelo mundo continuam com taxas de vacinação abaixo de 10% de suas populações, enquanto o mundo já administrou 7,8 bilhões de doses. A média apontaria para 104 para cada 100 pessoas no planeta. Mas os números escondem uma profunda desigualdade. Na África, a taxa é de apenas 6% de vacinados.
Num discurso nesta segunda-feira, ao aprovar o início do processo, a delegação do Brasil falou em nome do Mercosul e pediu que o processo fosse marcado por "transparência". "Decisões precisam ser resultado de discussão ampla e que inclua todos", alertou Tovar Nunes, embaixador do Brasil na OMS.
Para ele, o bloco sul-americano quer garantias de que o tema de acesso a remédios, vacinas e tratamentos esteja como uma das prioridades. O embaixador ainda insistiu que o Brasil quer um lugar no órgão que irá liderar o processo negociador.
Transparência
Outro ponto de discórdia se refere à obrigação de governos de relatar casos de surtos e variantes. Auditorias internas na OMS já demonstraram que o sistema não funciona, já que governos que optam por ser transparentes acabam sofrendo restrições, fechamento de fronteiras e isolamento.
Nesta semana, a situação da África do Sul foi mais um capítulo dessa situação. Pretória informou ao mundo sobre a variante ômicron, e acabou sendo punida com o fim das ligações aéreas do país com o mundo. O gesto de países ricos foi criticado pela OMS, neste fim de semana.
Ao mesmo tempo, países europeus querem que o novo acordo estabeleça a criação de missões internacionais, que terão o poder de entrar em países e a necessidade de criar uma espécie de direito à inspeção, sempre que um surto aparecer.
Os emergentes, porém, alertam que não existe clareza sobre quem estaria sob comando dessa inspeção e sob qual mandato.
O temor é que, sendo países tropicais, esses locais sejam mais frequentemente alvos de pressões por missões de inspeção, justamente pela existência de diferentes surtos.
Missões internacionais, portanto, poderiam significar também o questionamento da segurança de algumas dessas áreas e a declaração de zonas de interesse internacional. No Brasil, esse cenário é considerado como uma ameaça contra a soberania.
Além da inspeção, uma das propostas fala na criação de pontos focais da OMS dentro de cada um dos países, com total independência para agir. A proposta também enfrenta resistência dentro do governo brasileiro.
Nesta semana, as copresidentes da painel criado para avaliar a resposta internacional à pandemia emitiram uma declaração de apoio ao tratado. Elas advertiram que "a necessidade de reformas é urgente", e pediram aos países "que trabalhem com o propósito de obter resultados reais que protejam as pessoas".
"O que é necessário agora é que os países deem um empurrão final para que a oportunidade de criar um mundo mais seguro não nos escape por entre os dedos", disse uma das líderes do processo, a ex primeira-ministra da Nova Zelândia Helen Clark.
"Perguntamos: se esta pandemia representando uma ameaça para a saúde e o bem-estar da humanidade no mundo inteiro não pode catalisar uma mudança real, o que irá?", completou.
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