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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Terras indígenas foram "roubadas" nesses quatro anos, alerta relator da ONU

Indígenas acampam na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, desde o último domingo (22) - Fernanda Pierucci/Futura Press/Estadão Conteúdo
Indígenas acampam na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, desde o último domingo (22) Imagem: Fernanda Pierucci/Futura Press/Estadão Conteúdo

Colunista do UOL

28/09/2022 04h00

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Resumo da notícia

  • Em entrevista exclusiva à coluna, relator da ONU para os Povos Indígenas, Francisco Cali Tzay, denuncia a "destruição" da Funai
  • Segundo ele, parte do impacto das políticas de Bolsonaro é "irreversível"

Os últimos quatro anos foram marcados pelo "roubo" das terras indígenas no Brasil e por uma destruição da Funai. O alerta é do relator da ONU para os Povos Indígenas, Francisco Cali Tzay.

Profundo conhecedor do Brasil, o relator enviou diversas denúncias ao governo de Jair Bolsonaro desde 2019 e apontou para graves violações de direitos humanos no país. Ao longo dos últimos anos, ele ainda recebeu dezenas de indígenas, ativistas e representantes da sociedade civil brasileira.

Em entrevista à coluna, um dos principais especialistas em direitos dos povos indígenas no mundo insiste que parte da destruição realizada nos últimos anos no Brasil não terá como ser resgatada. Nesta quarta-feira, ele receberá novas denúncias contra Bolsonaro, apresentadas por diferentes grupos indígenas brasileiros que estão nesta semana na ONU, em Genebra.

Desde que assumiu o governo, em 2019, Bolsonaro prometeu e cumpriu que não iria demarcar nenhum centímetro extra de terras indígenas. O resultado, segundo os grupos de direitos humanos, foi a explosão da violência. Já o presidente usou cada um de seus discursos na tribuna da ONU para garantir que seu governo protege os indígenas e que as áreas demarcadas são maiores que os territórios de países europeus.

O discurso não convenceu ninguém na agência internacional. "A grande ameaça que os povos indígenas no Brasil enfrentaram nos últimos quatro anos foi a usurpação de suas terras, a ocupação ilegal de suas terras", disse. "E o translado de outras pessoas não indígenas para argumentar que essas terras estão ocupadas e que podem ser exploradas em seus recursos ", afirmou Cali Tzay.

"Essas terras foram roubadas. Eram terras demarcadas legalmente", alertou. Segundo ele, isso só foi possível por conta de uma operação, ao mesmo tempo, da "quase destruição da Funai".

"A Funai estava tendo um papel bastante importante para a política indígena, de proteção a seus direitos. A única forma (de levar adiante o roubo de terras) foi destruí-la completamente", afirmou.

Cali Tzay lembra como policiais federais e militares foram colocados em cargos de responsabilidade na agência estatal. "Isso é uma militarização das instituições indígenas, justamente para destruí-las e poder ocupar as terras dos povos indígenas", disse.

"As ameaças, as mortes, as violações contra mulheres e meninas, todos os dias temos noticias de assassinatos", lamentou.

Para o relator, a destruição registrada nos últimos anos terá consequências de longo prazo. "Reconstruir não vai ser fácil", admitiu. "Temos de lembrar que muitos dos povos que foram atacados estavam em contato inicial ou não estavam sendo contactados", disse.

"E são eles os que estão sob ataque, sob a justificativa de que são os supostos obstáculos para o desenvolvimento econômico do Brasil", alertou.

"Então, como vamos fazer a reconstrução de um povo não contatado?", questionou. "É algo irreparável", lamentou o relator.

Ele destacou como, no mês passado, recebeu a notícia da morte do último membro de uma tribo no Brasil. "Essa é a perda completa de conhecimento de um povo inteiro", disse.

"O balanço desses últimos quatro anos é profundamente negativo", afirmou. Questionado se a crise que vivem os indígenas é resultado da omissão do estado ou atos deliberados, ele conclui: "ambos".