Topo

Jamil Chade

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Crise no Brasil leva embaixadores estrangeiros a ver repetição de Capitólio

Daniel Silveira, ao lado de homem travestido de "viking do Capitólio", em Niterói (RJ) - Matheus de Moura/UOL
Daniel Silveira, ao lado de homem travestido de 'viking do Capitólio', em Niterói (RJ) Imagem: Matheus de Moura/UOL

Colunista do UOL

24/10/2022 13h10

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

O episódio de violência com o ex-deputado Roberto Jefferson, o uso desenfreado de desinformação e a hesitação de Jair Bolsonaro em defender as instituições voltam a acender o alerta de governos estrangeiros sobre o potencial caos que pode tomar conta do Brasil, no momento de definição da eleição presidencial no país.

Para alguns dos representantes estrangeiros, não está descartado um cenário de repetição dos incidentes nos EUA, quando apoiadores de Donald Trump invadiram o Capitólio.

O UOL apurou que embaixadas estrangeiras em Brasília têm reportado às suas capitais um clima de "tensão máxima" e apontam que a semana será decisiva. Alguns elementos chamaram a atenção: a capacidade de mobilização de apoiadores para situações de confronto com forças de ordem, a interferência do Executivo em assuntos que deveriam estar restritos à Justiça, os ataques ao STF e a influência decisiva das operações de desinformação.

Alguns desses pontos foram os ingredientes decisivos para os ataques contra o Congresso americano, em 6 de janeiro de 2021, e que chacoalharam com a democracia americana.

Diplomatas relataram à reportagem que, depois do final do primeiro turno, chamou a atenção a intensificação da ofensiva de desinformação, principalmente do lado bolsonarista. A esperança de que as instituições pudessem lidar com tal fenômeno se desfez diante da onda de mentiras que assolou as redes sociais.

Para governos estrangeiros, a eleição no Brasil é considerada em parte como fundamental para entender de que maneira as estratégias de desinformação avançaram e ganharam em sofisticação.

Se o cenário já era considerado como preocupante, duas fontes diferentes em embaixadas estrangeiras confirmaram que, diante do uso granadas e 20 tiros por parte de um aliado de Bolsonaro, além da decisão de mobilizar seus apoiadores, a preocupação de "caos" se confirmou.

Falando na condição de anonimato, um desses embaixadores estrangeiros apontou como o envio do ministro da Justiça para lidar com Jefferson revelou um "estranho" privilégio ao ex-deputado, concedido por Bolsonaro.

A avaliação dos governos estrangeiros é de que essa atitude não ajuda a convencer ao restante do mundo de que o Executivo não pretende fazer intervenções, sempre que necessário, em outros poderes.

Tampouco ajudaram as declarações de Bolsonaro contra o Judiciário, assim como o ataque do vice-presidente Hamilton Mourão, de que tal situação com Jefferson "acontece porque o sistema de freios e contrapesos não está funcionando".

Na imprensa estrangeira, os acontecimentos do fim de semana envolvendo um aliado de Bolsonaro - no caso, Roberto Jefferson - também foram apresentados como um sinal preocupante do potencial de violência política. Na ONU e na OEA, declarações públicas se repetiram nas últimas semanas, apelando aos candidatos no Brasil a não incentivar a violência e para que abandonassem o discurso de ódio.

Coordenação reforçada

Enquanto a crise política nacional ganha novos contornos, governos estrangeiros confirmaram que intensificaram os contatos entre capitais europeias e na América do Norte para que, de forma coordenada, atuem para não deixar espaço para um limbo político no Brasil.

A estratégia será a de reconhecer, quase que imediatamente após o anúncio do TSE, o resultado chancelado pela autoridade eleitoral no Brasil.

Tal medida foi adotada pelos europeus para frear qualquer avanço de Donald Trump, em sua tese de que a eleição teria sido fraudada nos EUA. Agora, no caso brasileiro, americanos e europeus querem repetir a estratégia na esperança de dar uma sinalização clara de que um questionamento não terá respaldo internacional.

O entusiasmo dos observadores internacionais que estiveram no primeiro turno com o profissionalismo do TSE e a fiabilidade das urnas também fortaleceu a percepção das embaixadas estrangeiras de que poderão adotar a estratégia de reconhecimento dos resultados, sem prejuízo para sua própria reputação.

As missões da OEA e do Mercosul aplaudiram a organização do primeiro turno das eleições, insistindo para a segurança das urnas eletrônicas, questionadas pelo bolsonarismo.