Jamil Chade

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Reportagem

Vitória da extrema direita na França afetará guerras, Mercosul e clima

Uma vitória da extrema direita ameaça gerar um profundo impacto na política externa da França --a segunda maior economia da Europa-- com repercussão na guerra na Ucrânia, relação com os EUA, no destino da UE (União Europeia), no acordo comercial com o Mercosul e na própria atuação da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte).

A extrema direita foi a grande vencedora do primeiro turno da eleição legislativa na França, num voto considerado como histórico, e se aproxima de assumir o governo do país pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial.

O partido que surge como vencedor no primeiro turno da eleição é comandando por Marine Le Pen. Ainda que ela tenha oficialmente abandonado a ideia de uma saída da França da UE, seu posicionamento promete questionar o funcionamento do bloco.

A extrema direita já alertou que, se sair vitoriosa, vai determinar quem será o comissário da França na nova Comissão Europeia.

Membro permanente no Conselho de Segurança da ONU e potência nuclear, a França tem sua política externa em grande parte definida por seu presidente. De fato, em um recente encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Emmanuel Macron deixou claro que nada mudaria nesse setor.

Mas o homem que pode assumir o cargo de primeiro-ministro pela extrema direita, Jordan Bardella, já deixou claro que vai confrontar o posicionamento de Macron no mundo e que considera que não existe um consenso legal sobre a atribuição exclusiva da presidência a dar as cartas em temas de defesa e de diplomacia.

Ainda durante a campanha, Bardella já anunciou que não vai permitir que a França envie tropas para a Ucrânia ou que se engaje em uma guerra direta contra a Rússia, uma proposta que chegou a ser considerada por Macron.

Sem qualquer experiência em governos, o líder de apenas 28 anos também indicou que vai usar seu eventual posto de primeiro-ministro para barrar o envio de certas armas para Kiev. Para isso, porém, ele terá de formar maioria no segundo turno, no próximo domingo (7).

O movimento de extrema direita foi acusado de manter relações com Vladimir Putin, inclusive com financiamento para suas campanhas no passado. Foi o mesmo partido que sugeriu que a França não devesse integrar o comando da Otan.

Mercosul ainda mais distante

Um governo da extrema direita também ameaça enterrar de vez qualquer perspectiva de um acordo comercial com o Mercosul. O grupo de Le Pen tem como parte de sua base justamente o setor rural, a maior resistência contra qualquer tipo de abertura comercial ao Brasil.

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Em conversas com a diplomacia brasileira, os representantes de Macron chegaram a alegar que não poderiam fazer mais concessões ao Mercosul, sob o risco de perder esses eleitores.

Agora, entre negociadores, um eventual governo de Bardella não irá permitir que a França ratifique um acordo com o Mercosul e o risco é de que o processo fique congelado por mais três anos, até a próxima eleição presidencial.

Para analistas e diplomatas estrangeiros, um desacordo na política externa da França pode enfraquecer ainda mais o posicionamento da Europa no palco global.

Palestinos podem perder aliado

Um governo da extrema direita ainda ameaça os interesses dos palestinos. Sob Macron, a França passou a ser um dos poucos governos europeus a criticar abertamente Israel, defender o Estado palestino e votar a favor de um cessar-fogo no Conselho de Segurança.

Mas Le Pen tampouco conta com o apoio de uma parcela dos judeus franceses. Em comunicado, estudantes judeus no país alertaram que o "perigo é iminente" e apelam para que haja uma união para derrotar a extrema direita.

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Jean Marie Le Pen, pai da atual líder do RN, chegou a dizer no passado que o Holocausto havia sido um "detalhe da história".

Imigração e clima

Não faltará ainda uma pressão extra para que a Europa redefina sua política de imigração, com um impacto tanto para grupos de africanos como do Oriente Médio.

O grupo de Le Pen promete formar alianças com outros governos de extrema direita pela Europa para transformar o debate sobre imigração essencialmente em uma questão de segurança nacional, com novas barreiras e deportações.

Entre os negociadores, as dúvidas também persistem sobre o compromisso da extrema direita com os pactos climáticos assinados pela França e que preveem, pelo menos teoricamente, que as grandes potências destinem bilhões de euros para a transição energética nos emergentes.

Tampouco fica claro qual seria o resultado nos projetos comuns do Brasil e França para a preservação da floresta.

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"Entraremos em um território desconhecido", admitiu um negociador.

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