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Jamil Chade

REPORTAGEM

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No Brasil, declaração de Bento 16 abriu mal-estar com indígenas

13.mai.2007 - O então papa Bento 16 acena para fiéis na chegada à Basílica, no Santuário Nacional de Aparecida - L. C. Leite/Folhapress
13.mai.2007 - O então papa Bento 16 acena para fiéis na chegada à Basílica, no Santuário Nacional de Aparecida Imagem: L. C. Leite/Folhapress

Colunista do UOL

31/12/2022 09h56

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Se a viagem do papa Bento 16 ao Brasil, em 2007, foi considerada como um sucesso pelo Vaticano e mesmo por religiosos brasileiros, um episódio abriu uma crise e revelou um posicionamento do pontífice que causou incômodo: ele declarou que "nenhum indígena foi convertido ao catolicismo por força". Diante de protestos, o alemão, que morreu hoje, amenizou o discurso algumas semanas depois.

Em seu discurso em Aparecida, ele ainda disse que os indígenas acolheram os padres europeus e que "Cristo era o salvador que esperavam silenciosamente".

Seu posicionamento não deixou de gerar atritos, com historiadores e entidades denunciando a morte de milhões de indígenas durante os anos da colonização e mesmo durante as últimas décadas.

É arrogante e desrespeitoso considerar nossa herança cultural menos importante que a deles
Jecinaldo Satere Mawe, coordenador-chefe da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), disse à época

O que ainda surpreendeu as entidades é que Bento 16 fez essas declarações dias depois de receber uma carta de lideranças indígenas denunciando um genocídio.

Esse não foi a único ponto polêmico. Sob o alemão, o Vaticano tentou incluir em um acordo com o Brasil a obrigação do governo de garantir um livre acesso aos religiosos a todas as reservas indígenas.

O texto do acordo chegou a ser debatido durante a visita do papa Bento 16 ao Brasil. O governo rejeitou os termos do acordo e a Santa Sé foi obrigada a desistir de incluir o tema na agenda.

Anos depois, em um sinal de sua preocupação em relação aos rumos do catolicismo no Brasil, o papa Bento 16 criticou o sincretismo na religião no país e pediu que os bispos brasileiros rejeitem "fantasias" na eucaristia.

O pontífice deu o recado durante o encontro que teve no Vaticano com 15 bispos da região Norte do Brasil.

Bento 16 alertou que "o culto não pode nascer de nossa fantasia", já que "a verdadeira liturgia pressupõe que Deus responda e nos mostre como podemos adorá-lo".

A mensagem foi clara: a Igreja não aceitará o sincretismo, nem mesmo em regiões distantes e onde a cultura local seja predominante. O papa pediu respeito pela centralidade de Jesus na celebração da missa.

Bento 16 insistiu que estava preocupado "por tudo o que possa ofuscar o ponto mais original da fé católica" e advertiu para os riscos do sincretismo.

O papa alertou aos bispos brasileiros que os desvios poderiam estar sendo motivado por uma mentalidade "incapaz de aceitar a possibilidade de uma verdadeira intervenção divina". Para ele, a eucaristia é um "dom demasiado grande para suportar ambiguidades e reduções".

Para o papa, o suposto descuido com o culto mostraria uma comunidade que precisaria rever suas práticas. "Quando na Santa Missa não aparece a figura de Jesus como elemento preeminente, mas uma comunidade atarefada em muitas coisas", se produz um "escurecimento do significado cristão do sacramento", afirmou.