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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Governo Bolsonaro disse para ONU que yanomamis estavam sendo atendidos

Colunista do UOL

23/01/2023 04h00

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O governo de Jair Bolsonaro escreveu cartas para as entidades internacionais dando garantias de que os integrantes do povo yanomami estavam sendo atendidos e que programas específicos sobre a saúde do grupo tinham sido implementados.

O relato do governo contrasta com as imagens que circularam o mundo de crianças indígenas sucumbindo à fome. A crise levou a equipe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a denunciar o abandono dos povos tradicionais por parte de Jair Bolsonaro. Os dados ainda apontam para 11 mil casos de malária em 2022 nas terras yanomamis e a morte de 570 crianças.

Em cartas obtidas pelo UOL e escritas pelo governo de Bolsonaro, a ONU recebeu relatos de que uma operação para garantir saúde e alimentos havia sido estabelecida, rebatendo a acusação de omissão e tentando convencer os organismos estrangeiros que o governo estava presente na região para lutar contra o garimpo ilegal.

A gestão Bolsonaro foi pressionada por relatores da ONU e pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos ao longo de pelo menos três anos. As cartas eram respostas a denúncias que os diferentes relatores das Nações Unidas tinham feito, cobrando explicações de Bolsonaro sobre um desmonte da política indigenista.

A última dessas comunicações data de 21 de março de 2022. Depois de receber a cobrança da ONU, o governo enviou uma carta de seis páginas na qual as autoridades indicavam que continuavam "completamente comprometidas" em assegurar os direitos humanos dos grupos indígenas.

No documento, não havia qualquer referência ao desmonte das estruturas do estado ou da Funai. O governo ainda destacava que o Ministério da Saúde mantinha um "departamento especializado dedicado à saúde indígena" e lista ações tomadas.

Não há tampouco nenhum indicador nem sobre os atendimentos realizados e nem o valor orçamentário destinado para o socorro desses grupos.

Em 27 de julho de 2021, o governo respondeu a uma denúncia especificamente sobre os yanomamis e suas condições de saúde e segurança.

No documento, o governo Bolsonaro destacava sua ação para:

  • Realizar operações "exitosas" para destruir a ação de garimpeiros e "colocar fim às atividades criminosas que pudessem ameaçar os yanomamis;
  • Monitoramento das taxas de mercúrio nas terras yanomamis por parte do Ministério da Saúde;
  • Programas para garantir acesso à água potável;
  • Medidas para conter a covid-19 e malária.

Um ano antes, diante da incapacidade de lidar com a crise de saúde e sem provar que suas ações eram suficientes, o governo Bolsonaro foi pressionado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) a agir.

Numa resolução de 17 de julho de 2020, a entidade outorgou medidas cautelares de proteção a favor dos yanomamis.

"A CIDH considerou que as pessoas beneficiárias estão em situação grave e urgente, pois seus direitos correm risco de danos irreparáveis", destacou o documento.

O pedido foi apresentado pela Associação Hutukara Yanomami e pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos para proteção dos membros da Terra Indígena Ianomâmi, composta por 321 aldeias diante da pandemia de covid-19.

Em 15 de junho daquele ano, o conselho recebeu o líder indígena Dário Vitório Kopenawa, que fez um depoimento dramático sobre a crise, incluindo a invasão garimpeira e a ameaça de saúde.

Já naquele momento, a Comissão identificou:

  • falhas no sistema de saúde para a população indígena, agudizadas pela pandemia;
  • presença ilegal de cerca de 20 mil garimpeiros no território, fomentando o fluxo do vírus das comunidades urbanas; contaminação da população pelo mercúrio;
  • atos de violência de garimpeiros contra a população indígena, principalmente suas lideranças.

Antes de emitir as medidas cautelares, a Comissão Interamericana consultou o estado. Mas, na decisão final, a entidade destacou que as informações apresentadas pelo Estado brasileiro "são gerais e programáticas e não permitem ver as ações implementadas diretamente à população beneficiária".

Assim, a CIDH solicitou ao Brasil que adotasse "as medidas necessárias para proteger os direitos à saúde, à vida e à integridade pessoal dos membros dos Povos Indígenas Ianomâmi.

Além de medidas preventivas contra a disseminação da covid-19, a entidade também pedia "assistência médica adequada em condições de disponibilidade, acessibilidade, aceitabilidade e qualidade, de acordo com os parâmetros internacionais aplicáveis".