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Brasil precisa responder aos atos golpistas, diz ex-embaixador de Obama
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"Se um crime não for punido, é como entregar a arma de volta ao responsável para que ele tente cometer o crime mais uma vez. E, da próxima vez, ele vai ser ainda mais violento para não fracassar".
O alerta é de Stephen Rapp, ex-embaixador na gestão de Barack Obama e responsável por assuntos de crimes de guerra e justiça internacional. Em entrevista exclusiva ao UOL, às vésperas da visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Washington, o americano insistiu sobre a necessidade de os atos de 8 de janeiro serem investigados e que Justiça seja feita.
Ele ainda destacou as semelhanças entre os acontecimentos liderados por movimentos trumpistas nos EUA, em 2021, e os ataques contra Brasília há um mês. "O que aconteceu no Brasil teve como modelo o Capitólio", constatou.
Rapp é considerado como uma das maiores autoridades mundiais em temas relacionados aos crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Entre 2009 e 2015, ele coordenou o apoio do governo dos EUA aos tribunais penais internacionais, incluindo o Tribunal Penal Internacional, bem como aos tribunais nacionais responsáveis por processar pessoas acusadas de genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
Foi graças a ele que a Comissão de Inquérito das Nações Unidas conseguiu acesso a 55.000 fotos documentando a tortura pelo regime de Assad.
De 2007 a 2009, Rapp atuou como promotor do Tribunal Especial para Serra Leoa, onde liderou o processo do ex-presidente liberiano Charles Taylor. Seu gabinete obteve as primeiras condenações da história por crimes contra a humanidade acusados de escravidão sexual e casamento forçado. De 2001 a 2007, ele atuou como o principal advogado no processo no Tribunal Penal Internacional para Ruanda. Foram suas denúncias que conseguiram as primeiras condenações da história contra a mídia de massa pelo crime de incitação direta e pública à prática de genocídio.
Para ele, o fato de o Brasil nunca ter lidado com os crimes da ditadura militar (1964-1985) tem uma conexão direta com a situação atual do país. "A impunidade traz impunidade", disse. Para ele, o fato de que nunca houve uma justiça transicional no Brasil manda uma mensagem aos eventuais movimentos golpistas, hoje, de que eles também podem ficar sem uma punição.
"Há uma relação entre os acontecimentos atuais no Brasil e a impunidade no passado", insistiu, numa alusão aos movimentos que pedem intervenção militar no país e que negam a existência de um golpe de estado em 1964.
Nem todos na América Latina, porém, repetiram os erros do Brasil. "A Argentina mandou um sinal diferente, processando os responsáveis pela ditadura. A Colômbia, neste momento, também da passos positivos", disse, numa referência ao processo de paz estabelecido depois do fim das Farc.
Rapp insiste que a ausência de punição existe em outras partes do mundo e em outros contextos. "A Rússia apenas está fazendo o que está fazendo na Ucrânia por já ter atuado da mesma forma na Síria, sem qualquer responsabilização", alertou. "Se não há uma punição por um crime, o responsável considera que ele pode ser cometido de novo", insistiu.
O embaixador lembra como estudos já indicaram que países que fizeram questão de investigar e punir os crimes de seus regimes ditatoriais conseguiram, em democracia, estabelecer sociedades mais pacíficas. "A violência caiu. Não apenas a violência política. Mas a violência na sociedade", destacou.
Sobre como lidar com os responsáveis de 8 de janeiro, no Brasil, Rapp insiste que qualquer ação precisa estar baseada em evidências. Mas destaca o papel central de processos na Justiça contra os responsáveis. "É uma coisa importante a ser feita", disse.
Rapp rejeita a tese daqueles que preferem acomodar lados diferentes, minimizar os crimes e evitar um racha na sociedade. "Existem aqueles que afirmam que um processo pode dividir a sociedade", disse. "Mas precisa haver uma resposta. Caso contrário, trata-se de um convite para que a próxima vez seja ainda mais violento", disse.
"O grupo (violento) não vai querer perder da próxima vez", completou.
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