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Jamil Chade

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O brasileiro que faz a Espanha se olhar no espelho

Vinícius Jr, do Real Madrid, comemora seu segundo gol contra o Liverpool. - PHIL NOBLE/REUTERS
Vinícius Jr, do Real Madrid, comemora seu segundo gol contra o Liverpool. Imagem: PHIL NOBLE/REUTERS

Colunista do UOL

22/05/2023 09h15

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Neste momento, um brasileiro está obrigando uma parcela da Espanha - um país que nem sequer lidou com seu passado colonial e nem com sua mais recente ditadura - a se olhar no espelho.

Vinicius Jr. não é hoje apenas vítima de crimes. Ele também sofre com a omissão e silêncio ensurdecedor de uma parte da sociedade que rejeita confrontar seu passado e lidar com seu presente.

Fica visível, pelo comportamento de um segmento da imprensa local, de dirigentes esportivos e mesmo de políticos, o quanto a questão incomoda.

Até hoje, o racismo não foi tipificado no Código Penal da Espanha. Ele entra como "delito de ódio". E só depois o ato criminoso pode ser definido como "motivos racistas".

Em 2021, o partido de extrema direita VOX, aliado ao bolsonarismo, fez uma proposta assustadora: apresentou um projeto de resolução para que o termo "motivos racistas" fossem retirados da definição do delito de ódio.

Diga-se de passagem que o VOX é também o partido dos herdeiros políticos de Franco e que tem como seu eleitor o presidente da La Liga, Javier Tebas.

Nesta segunda-feira, a presidente da Comunidade de Madri, Isabel Díaz Ayuso, insistiu que a Espanha "não é um país racista", ainda que admita que tal fenômeno precise ser lidado. Para justificar, lembrou que "isso também ocorre" com as "ofensas contra o rei". Ou seja, não entendeu nada. Ou não quer entender.

Enquanto isso, todos os indicadores apontam para uma alta nos incidentes racistas no país. Os dados oficiais coletados indicam que 1,7 mil delitos de ódio foram reportados às autoridades em 2021. Desses, 639 tinham "motivação racista", um número 24% superior aos dados registrados em 2019.

De acordo com a entidade SOS Racismo, 34% das vítimas desses ataques são sul-americanos. Metade das vítimas vive legalmente no país.

Nada disso é novo. Em 2013, uma relatoria da ONU visitou o país e alertou que a Espanha não contava com leis eficientes para combater o racismo.

Por anos, todas as promessas de diferentes governos em lidar com a situação ficaram paralisadas. A Lei contra o Racismo que havia sido prometida jamais foi submetida ao Parlamento e mesmo os compromissos assumidos por Madri com a Europa não saíram do papel.

Hoje, um brasileiro escancara um mal-estar com que muitos prefeririam não ter de lidar.

Vini Jr. coloca um país diante do espelho. E parte da imagem que se vê não é nada agradável.