Jamil Chade

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'Bom sinal' ao Mercosul: governo Lula celebra vitória de Ursula na Europa

A reeleição de Ursula von der Leyen como presidente da Comissão Europeia, nesta quinta-feira, é comemorada no governo brasileiro como um "bom sinal" para a preservação de alguma chance de um acordo entre a UE (União Europeia) e o Mercosul.

No Parlamento Europeu, a alemã recebeu 401 votos e assegurou a maioria para poder ser reconduzida a um novo mandato de cinco anos no comando do Poder Executivo do bloco europeu.

Fontes no Itamaraty confirmaram que as negociações com o Mercosul continuam, apesar de todos os obstáculos dos últimos meses. Ontem (17), uma reunião virtual foi realizada entre os negociadores de ambos os lados do Atlântico e um novo contato foi marcado para agosto.

Mas o processo aguardava uma definição de como seria a presidência da UE para que decisões fundamentais fossem tomadas.

Von der Leyen é do bloco conservador. Mas, nos últimos anos, tem sido uma das maiores aliadas ao projeto de um pacto de livre comércio com o Mercosul. Seu argumento é de que, sem esse mecanismo, existe o risco real de que os europeus percam ainda mais espaço na América do Sul para os chineses.

Um dos temores do Brasil era que, com a extrema direita no poder, o lobby protecionista do setor agrícola poderia vingar de uma maneira definitiva, enterrando o acordo por anos.

O processo que começou a ser negociado em 1999 atravessou diversas etapas. Com o governo de Jair Bolsonaro, os europeus deixaram claro que apenas fechariam um entendimento se ele adotasse regras ambientais claras, o que jamais ocorreu. Com a chegada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao poder, houve uma esperança de que o processo poderia ser rapidamente retomado.

Mas as exigências ambientais por parte dos europeus irritaram o Mercosul e o processo, uma vez mais, foi alvo de obstáculos. Lula esperava fechar um entendimento político no final de 2023, o que não foi possível, principalmente por conta do veto de Emmanuel Macron.

Agora, a esperança é de que com as eleições superadas nos principais países europeus, o processo possa voltar a caminhar.

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Negociadores, porém, alertam que nem e recondução da alemã significará que o diálogo e sua aprovação serão fáceis. O bloco de extrema direita avançou dentro do Parlamento Europeu e, assim, terá um papel ainda mais claro na definição das políticas comerciais.

Risco de extrema direita foi considerado em negociação

Macron estava ciente, nos últimos meses, que sair em apoio ao acordo com o Mercosul poderia ampliar os votos dos agricultores para a extrema direita.

Em fevereiro de 2024, uma mensagem de texto enviado pelo telefone pelo presidente da França para Van der Leyen deixou claro que ele não aceitaria o acordo de livre comércio entre os dois blocos.

A correria de Macron por barrar o entendimento não ocorria por acaso. Dias antes, negociadores do Mercosul e da Comissão Europeia estiveram reunidos e, para a surpresa do Brasil, todas as exigências apresentadas pelo Itamaraty no setor de licitações públicas - que movimenta em torno de US$ 114 bilhões - e que vinham sendo rejeitadas pela Europa foram acatadas pelo braço executivo do bloco.

Durante as conversas, o Brasil conseguiu que a Europa aceitasse algumas das demandas centrais da proposta do governo Lula:

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Excluir o SUS de qualquer abertura de mercados para a participação dos europeus em licitações públicas. A meta do Brasil, assim, é a de preservar o mercado bilionário para, assim, tentar fortalecer a indústria farmacêutica nacional.

A criação de uma margem de preferências para empresas nacionais em licitações públicas, atendendo aos objetivos da nova política industrial do governo. De acordo com negociadores, a Comissão Europeia topou o entendimento, sem impor condicionamentos ou limites.

Macron, então, se apressou em tentar bloquear o processo, principalmente diante de sua situação doméstica e a pressão dos fazendeiros.

Mas, para o Brasil, garantir que a eleição na Europa não se transformasse numa plataforma para a extrema direita era também estratégico. Parte da cólera dos agricultores estava sendo instrumentalizada pelos partidos populistas para ampliar suas influências e, eventualmente, transformar essa ira em apoio aos candidatos extremistas.

Com o risco de uma vitória de Donald Trump nos EUA e a presença de Javier Milei na Argentina, tampouco interessava ao governo Lula o fortalecimento da extrema direita global a criação de eixos de poder.

A esperança, agora, é que o processo negociador possa voltar a caminhar.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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