Jamil Chade

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ONU conclui: eleição na Venezuela foi alvo de irregularidade sem precedente

Um relatório preliminar da ONU sobre a eleição na Venezuela constatou que o processo foi marcado por irregularidades e falta de transparência. As conclusões estão sendo publicadas nesta quarta-feira (14) pela equipe de quatro especialistas da entidade que foram até Caracas a convite do governo de Nicolás Maduro para acompanhar a eleição.

"O processo de gerenciamento de resultados do Conselho Nacional Eleitoral ficou aquém das medidas básicas de transparência e integridade que são essenciais para a realização de eleições confiáveis", constatou a equipe da ONU.

"Ele não seguiu as disposições legais e regulamentares nacionais, e todos os prazos estipulados não foram cumpridos", indicou.

"De acordo com a experiência do Painel [da ONU], o anúncio do resultado de uma eleição sem a publicação de seus detalhes ou a divulgação dos resultados tabulados aos candidatos não tem precedentes nas eleições democráticas contemporâneas", constatou.

"Isso teve um impacto negativo sobre a confiança no resultado anunciado pelo CNE entre uma grande parte do eleitorado venezuelano", insistiu.

O informe destaca que Maduro apresentou uma reclamação à Câmara Eleitoral da Suprema Corte de Justiça, supostamente buscando uma revisão do processo e uma verificação dos resultados.

"Em 6 de agosto de 2024, a Câmara Eleitoral confirmou que havia recebido do CNE os protocolos de resultados e outros documentos solicitados. A Câmara anunciou que daria prosseguimento a um processo de verificação especializada da documentação apresentada pela CNE. Não há informações detalhadas disponíveis até o momento sobre como essa avaliação será realizada", disse o informe da ONU.

A ONU ainda "lamentou" que sua equipe, apesar de um pedido enviado, "não pôde se reunir com a Diretoria do CNE antes do encerramento do processo eleitoral".

Embora os números de fontes nacionais variem e o Painel da ONU não tenha tentado verificar sua precisão, ele observou relatórios que afirmam que mais de 20 pessoas - incluindo um soldado - foram mortas e mais de 1.000 pessoas foram detidas entre 29 de julho e 2 de agosto de 2024 como resultado de protestos após o anúncio dos resultados. Esses números relatados continuaram a aumentar.

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"O Painel também ouviu relatos de ameaças e intimidações contra agentes partidários e funcionários das seções eleitorais", disse.

Processo sem transparência

De acordo com o informe da ONU, no dia da votação, a transmissão dos resultados eletrônicos funcionou bem no início, "mas foi interrompida abruptamente horas depois do fechamento das seções eleitorais, sem nenhuma informação ou explicação fornecida aos candidatos na época ou ao Painel da ONU".

"No momento de anunciar os resultados, o presidente do CNE declarou que um ataque cibernético terrorista havia afetado a transmissão e causado um atraso no processo de tabulação", apontou o informe.

Segundo a ONU, o CNE adiou e posteriormente cancelou três auditorias pós-eleitorais importantes, inclusive uma sobre o sistema de comunicação que poderia ter esclarecido a ocorrência de ataques externos à infraestrutura de transmissão.

Na madrugada de 29 de julho de 2024, o CNE anunciou oralmente que Maduro havia vencido a eleição com 5.150.092 votos (51,2%). Em 2 de agosto, o CNE confirmou o presidente Maduro como o vencedor com 6.408.844 votos (51,95%), seguido por González, com 5.326.104 votos (43,18%), com base no que disse ser 96,97% dos resultados das pesquisas.

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"Os anúncios dos resultados consistiram em comunicações orais sem apoio de infográficos", afirmou a ONU.

"O CNE não publicou até agora nenhum resultado (ou resultados detalhados por seção eleitoral) para apoiar seus anúncios orais, conforme previsto na estrutura legal para eleições", concluiu o informe.

Na avaliação da equipe da ONU, o Conselho Eleitoral implementou medidas para a produção de protocolos de resultados impressos, em nível de seção eleitoral. "Essa foi uma importante salvaguarda de transparência (ou seja, um rastro de papel), com vários recursos de segurança, como códigos QR e hash com assinaturas exclusivas, bem como assinaturas físicas de funcionários e agentes", disse.

"Esses recursos de segurança, como um todo, parecem ser muito difíceis de serem fabricados. A estrutura legal estipulava que cada protocolo original impresso deveria ser lacrado e protegido por pessoal militar", destacou.

"Cópias deveriam ser distribuídas aos funcionários das seções eleitorais, agentes partidários e observadores credenciados", informou.

"Entretanto, o Painel recebeu vários relatos de que agentes de partidos de oposição haviam sido impedidos de obter tal cópia. Além disso, apesar das garantias de que o faria, o CNE não publicou esses protocolos de resultados", concluiu.

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