Jamil Chade

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Opinião

'Refugiados americanos' e a destruição de Malibu vão acordar as elites?

Em Malibu, a renda média per capita da cidade americana é de US$ 180 mil anuais. No Sudão, a renda é de apenas US$ 2,2 mil por ano. Santa Bárbara não é Ouagadougou. Mas algo começa a demonstrar ao planeta que, diante de desastres naturais, a fama ou as estatuetas do morador da casa pouco vão importar.

Nas últimas horas, as imagens dos incêndios na Califórnia revelam a dimensão de uma crise que já obrigou 100 mil americanos a deixarem suas casas.

A ONU e ativistas climáticos insistem que se não houver uma mudança profunda no comportamento da sociedade, de governos e da produção, isso que tudo que estamos vendo será lembrado apenas como o começo de uma nova era profundamente desafiadora.

Até 2050, 79 milhões de residências pelos EUA poderiam estar ameaçadas pelo fogo. Desde 2017, o estado da Califórnia já perdeu mais de 31 mil casas para os incêndios e, em 2025, as dúvidas são reais sobre a capacidade de as seguradoras bancarem os prejuízos bilionários que começam a ser contados.

No mundo, os números também revelam essa nova dimensão do deslocamento em massa de pessoas. Mas nenhum deles era Paris Hilton ou Ben Affleck. Eram apenas invisíveis.

Em 2022, por exemplo, desastres relacionados ao clima geraram mais da metade dos deslocados no mundo. Um total de 32,6 milhões de pessoas e um aumento de 40% em relação aos números de 2008.

Mas eles não moravam em Malibu.

Dados da ONU mostram que 60% dos refugiados estão hoje em países que estão entre os mais vulneráveis às mudanças climáticas.

De fato, as mudanças climáticas são o que se chama de "multiplicador de ameaças". Ela amplia o impacto de outros fatores que podem contribuir para o deslocamento, como a pobreza, a perda de meios de subsistência e as tensões relacionadas à diminuição dos recursos, criando, em última análise, condições que podem levar a guerras e mais deslocamentos.

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Quando eu estive em Ouagadougou, capital de Burkina Faso, me explicaram como alguns dos piores casos de violência e deslocamento nos últimos anos ocorreram nas áreas mais pobres e afetadas pela seca, onde grupos armados exploraram as tensões em relação à diminuição das fontes de água e das terras aráveis.

Mas eles eram invisíveis. Eram africanos, latino-americanos e de tantas outras regiões que, diante das dificuldades, descobriam que eram tratados como criminosos por tentar cruzar fronteiras para fugir da seca, do fogo ou das inundações. O conceito de humanidade não vinha em suas certidões de nascimento.

Agora, são as mansões de Paris Hilton e Ben Affleck que estão ameaçadas, entre tantas outras.

Será que finalmente reagiremos?

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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