Hamas e Israel fecham acordo de cessar-fogo e liberação de reféns
15 meses e 45 mil mortos depois, o Hamas e Israel chegam a um acordo de cessar-fogo, gerando imagens de milhares de palestinos e israelenses comemorando em ambos os lados da fronteira. O pacto, negociado com a participação do Qatar e entrando pela madrugada dos últimos dias, prevê a troca de reféns e prisioneiros em diferentes etapas, assim como a desocupação gradual da Faixa de Gaza por parte das tropas israelenses. O acordo, que Donald Trump tentou reivindicar como sua conquista, entra em vigor no dia 19 de janeiro, domingo.
O cessar-fogo foi anunciado pelo primeiro-ministro do Qatar, Mohammed bin Abdulrahman Al Thani, em coletiva de imprensa. Segundo ele, o pacto é um "começo" e que agora as negociações precisam ocorrer possibilitar uma "paz duradoura".
Instantes depois, foi o presidente Joe Biden que fez o anúncio. "Hoje, após muitos meses de intensa diplomacia por parte dos Estados Unidos, juntamente com o Egito e o Qatar, Israel e o Hamas chegaram a um acordo de cessar-fogo e reféns", disse Biden.
Confirmando que o pacto é o mesmo que seu governo havia oferecido em maio de 2024, Biden explicou que a primeira fase durará seis semanas e inclui um "cessar-fogo total e completo, a retirada das forças israelenses de todas as áreas povoadas de Gaza e a libertação de vários reféns mantidos pelo Hamas". Em troca, palestinos presos por Israel serão liberados.
Apesar de ter sido anunciado também pela Casa Branca, pelo presidente eleito Donald Trump, pelos membros do Hamas e por fontes estrangeiras, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, afirma que o pacto ainda não estava finalizado e que ele espera que isso possa ser feito na noite desta quarta-feira (15). Seu gabinete, porém, já foi convocado para votar a proposta na quinta-feira (16).
"Devido à posição firme do primeiro-ministro Netanyahu, o Hamas recuou no último momento de sua exigência de alterar o posicionamento das forças ao longo do Corredor Filadélfia. No entanto, várias cláusulas da estrutura continuam sem solução, e esperamos que os detalhes sejam finalizados hoje à noite", afirmou seu gabinete.
Na ONU e entre os diplomatas palestinos, o acordo também é visto como sendo já uma realidade. O pacto — que já havia sido proposto há seis meses e recusado — desmonta a promessa de Netanyahu de que a guerra apenas terminaria quando o Hamas fosse aniquilado. A Autoridade Palestina alertou que não aceitará qualquer plano futuro que não inclua sua administração sobre Gaza.
Imediatamente, a ONU ordenou que dezenas de caminhões com ajuda humanitária se preparem para entrar imediatamente na região abalada por um dos piores conflitos em anos. O governo israelense começou a negociar com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha sobre como seria a troca de prisioneiros.
Além de bombas, os civis foram afetados pela fome e frio. A crise começou quando, em 7 de outubro de 2023, o Hamas atacou Israel, num ato que gerou 1,3 mil mortos. A resposta por parte dos israelenses levou entidades como Anistia Internacional a denunciar um genocídio em Gaza.
O próprio primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, foi alvo de um mandado de prisão por crimes de guerra e crimes contra a humanidade por parte do Tribunal Penal Internacional.
Trump reivindica autoria do acordo
Antes mesmo de Benjamin Netanyahu fazer o anúncio, o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, se apressou a publicar em suas redes sociais que o acordo havia sido atingido, reivindicando a autoria. "Temos um acordo sobre os reféns no Oriente Médio", disse. "Eles serão liberados em breve. Obrigado", escreveu Trump.
Momentos depois, ele voltou às redes sociais para dizer que o acordo só foi possível graças a sua eleição. "Isso pois sinalizou para o mundo inteiro que meu governo buscaria a paz e negociaria acordos para garantir a segurança de todos os americanos e de nossos aliados", disse.
Ele ainda indicou que seu enviado para o Oriente Médio, Steve Witkoff, continuaria a "trabalhar em estreita colaboração com Israel e nossos aliados para garantir que Gaza nunca mais se torne um refúgio seguro para terroristas".
"Continuaremos a promover a paz através da força em toda a região, à medida que aproveitamos o impulso desse cessar-fogo para expandir ainda mais os Acordos Históricos de Abraão. Este é apenas o começo de grandes coisas que estão por vir para os Estados Unidos e, de fato, para o mundo", escreveu.
"Já conquistamos muito sem estarmos na Casa Branca. Imaginem todas as coisas maravilhosas que acontecerão quando eu retornar à Casa Branca e minha administração estiver totalmente confirmada, para que eles possam garantir mais vitórias para os Estados Unidos", disse.
Há poucos dias, o presidente eleito alertou ao Hamas que, se não houvesse um acordo, "o inferno se abateria" sobre eles. Nos bastidores, foi um de seus enviados quem também atuou para convencer o governo de Netanyahu que o pacto era necessário.
Nos EUA, diplomatas apontam que a equipe de Biden trabalhou nos últimos dias pelo acordo, em consultas com os nomeados por Trump para a região.
Enquanto isso, em sabatina no Senado americano, o nome escolhido para chefiar a diplomacia de Trump, Marco Rubio, indicou que o cessar-fogo apenas será mantido se a liberação de reféns for cumprida.
Rubio ainda alertou que o processo judicial no Tribunal Penal Internacional contra Israel por conta dos crimes em Gaza está abalando a credibilidade da corte. Num discurso de firme apoio aos israelenses, o novo chefe da diplomacia americana insistiu que o processo em Haia é um "teste". "A ideia é de que, se eles conseguirem processar Israel, os próximos serão os soldados e líderes americanos", disse.
Papel do Qatar e fragilidade de Netanyahu
Fontes ainda confirmaram que o acordo foi alcançado após reuniões separadas realizadas pelo primeiro-ministro do Qatar, Mohammed bin Abdulrahman al-Thani, com negociadores do Hamas e de Israel em seu escritório. Ainda hoje, EUA, o Qatar e o Egito emitirão uma declaração conjunta.
Enquanto isso, o gabinete de Netanyahu se reunirá nesta quinta-feira (16) para votar a proposta. Mais cedo, Netanyahu tinha negado que havia recebido um sinal oficial por parte dos palestinos.
Agências como a Reuters, e os jornais Haaretz e Times of Israel relataram que membros das equipes negociadoras confirmam a aceitação por parte do Hamas, citando fontes israelenses e estrangeiras. Tanto a Sky News como a rede Al Jazeera informaram que um funcionário do Hamas disse que o líder do grupo, Khalil al-Hayya, entregou a aprovação do acordo de cessar-fogo aos mediadores em Doha.
Hamas queria mapa da retirada
Um dos últimos obstáculos foi a forma pela qual Israel retiraria seus soldados de Gaza. Tel Aviv enviou ao grupo palestino os mapas dos locais que planeja realizar a evacuação das tropas e foi a resposta aceitando o plano que faltava para o pacto ser anunciado.
O Hamas queria garantias de retiradas principalmente na região de fronteira entre Gaza e o Egito.
Netanyahu vem sofrendo pressão por parte da ala mais radical de seu governo e ministros da base ultraconservadora avaliam até mesmo renunciar se o acordo fosse fechado. Mas o primeiro-ministro calcula que tem os votos necessários no Parlamento para aprovar o pacto.
Agora, as primeiras liberações de reféns poderiam ocorrer a partir de domingo. Para Biden, a esperança é de que o acordo ajude a salvar seu legado na presidência. Críticos, porém, alertam que o cessar-fogo não irá desfazer a percepção pública de que o governo americano foi cúmplice da destruição de Gaza. Enquanto isso, 62 palestinos foram mortos nas últimas 24 horas em ataques israelenses, incluindo uma criança de sete anos.
O que prevê o acordo
Primeira etapa
Retorno dos reféns: Durante 42 dias, 33 reféns israelenses dos cerca de 98 mantidos em Gaza pelo Hamas serão soltos. A lista vai incluir crianças, mulheres, soldados do sexo feminino, homens com mais de 50 anos, feridos e doentes. Em troca, Israel irá liberar cerca de 1.000 prisioneiros palestinos de suas cadeias. No total, Israel conta com 12 mil palestinos detidos.
Retirada das tropas: Israel iniciaria uma retirada gradual de suas tropas, principalmente na fronteira entre Gaza e o Egito, conhecido como corredor Filadélfia.
Retorno dos palestinos: A população teria a permissão para voltar ao norte de Gaza, e a passagem de Rafah entre o Egito e Gaza começaria a ser reaberta gradualmente. Isso, porém, valeria apenas para quem estiver desarmado.
Socorro da ONU: O governo de Israel ainda permitirá mais ajuda humanitária desesperadamente necessária em Gaza, com a entrada de 600 caminhões por dia, dez vezes mais do que é autorizado hoje. Na ONU, as agências já trabalham para que o plano seja imediatamente implementado.
Segunda etapa
Duas semanas depois do início do processo, seriam iniciadas negociações para uma segunda leva de troca de reféns, incluindo soldados e civis mais jovens. Em troca, haveria uma retirada completa das tropas de Israel de Gaza.
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