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Josias de Souza

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Do avesso, Bolsonaro poderia ter virado um candidato imbatível em 2022

Colunista do UOL

08/10/2021 18h30

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A pandemia do coronavírus teve o efeito de uma guerra devastadora. O inimigo é biológico, microscópico. No mundo, já matou mais de 4,5 milhões de pessoas. No Brasil, o número de cadáveres ultrapassou nesta sexta-feira a triste marca de 600 mil.

Em Hiroshima, nas semanas seguintes à grande explosão, a bomba atômica matou cerca de 140 mil. Mal comparando, é como se a pandemia tivesse despejado sobre a cabeça dos brasileiros quatro bombas nucleares.

Uma das melhores maneiras que um presidente tem de unir a nação em seu apoio é declarar guerra a um inimigo comum. Seguindo essa lógica, vários presidentes americanos bombardearam inimigos externos, muitas vezes sem a formalidade de uma consulta às Nações Unidas.

Bolsonaro poderia ter feito o mesmo. Sem o inconveniente de declarar guerra à Venezuela. Ou à Argentina. Bastaria combater o inimigo interno. À frente de um governo da guerra, pela guerra e para a guerra, o capitão revelou-se capaz de tudo, exceto de guerrear contra o vírus.

Bolsonaro fez uma opção preferencial pelo vitupério. Para ele, a covid era uma "gripezinha", o tratamento precoce com cloroquina salvaria o mundo e as vacinas transformariam cidadãos em jacarés.

Colecionou quatro ministros da Saúde, entre eles um general que promoveu uma intervenção militar na pasta. Alvejado por uma CPI, está prestes a ser indiciado pela prática de uma penca de crimes.

O "governo sem corrupção" conviveu com um redemoinho de picaretagens na oferta de vacinas. Coronéis e capitães tiveram os glúteos expostos na vitrine. A compra da covaxin, negociata de R$ 1,6 bilhão, foi abatida em pleno voo.

Imagine que país extraordinário seria o Brasil se um surto de sensatez tivesse se abatido sobre o Planalto no início da pandemia. Bolsonaro chamaria os governadores a Brasília. Pediria a todos que esquecessem a mesquinharia do jogo político.

Esse presidente hipotético anunciaria a criação de um comitê nacional de gerenciamento da crise. Unificaria a estratégia de distanciamento social. Percorreria o mundo atrás de vacinas.

O Bolsonaro de mostruário exibiria frascos do Butantan para as emas do Alvorada. Levaria ao ar uma campanha massiva de esclarecimento sobre a importância da vacinação. Hoje, a taxa de brasileiros imunizados com duas doses não seria de 45%, mas de 70% a 80%.

Nesse roteiro, não haveria CPI, o número de mortos seria menor e a blindagem do centrão seria desnecessária.

Se tivesse aproveitado o vírus para unir os brasileiros, Bolsonaro seria um candidato imbatível na sucessão de 2022. Com seu negacionismo, acabou virando uma oportunidade que o vírus aproveitou.