Josias de Souza

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Opinião

Silêncio na PF grita mais alto que barulho de Bolsonaro na Paulista

Bolsonaro sustenta que é infundada a acusação de que tentou dar um golpe de Estado. Intimado a prestar depoimento nesta quinta-feira, teria a oportunidade de refutar os indícios e as provas que a Polícia Federal diz ter colecionado contra ele. Mas confirmou a intenção de silenciar durante o interrogatório. Tornou-se um inocente inusitado, do tipo que prefere calar a demonstrar sua inocência.

"Os advogados que decidem", disse Bolsonaro, terceirizando aos seus defensores a decisão de fugir do exercício do sacrossanto direito ao contraditório. A Constituição assegura aos suspeitos a prerrogativa de se esconder atrás do silêncio.

A prerrogativa constitucional é reservada aos encrencados que não desejam correr o risco de se autoincriminar. Nesse contexto, a mudez de Bolsonaro emite um estrondo constrangedor.

Os advogados do capitão protocolaram três recursos junto ao Supremo nesta semana. Tentaram adiar o depoimento sob a alegação de que não tiveram acesso à íntegra do inquérito. Alexandre de Moraes refutou o argumento, refutando a protelação. Sustentou que os autos estão à disposição, exceto os trechos cujo sigilo é necessário para preservar diligências em andamento.

O terceiro recurso foi levado ao Supremo nesta quarta-feira, véspera do depoimento. Nele, a defesa de Bolsonaro alegou que, sem apalpar o conteúdo de todos os celulares e computadores apreendidos pela PF e a íntegra da delação do ex-ajudante de ordens Mauro Cid fica comprometida a "paridade de armas". Insinuou que o sigilo seria uma estratégia para "surpreender o investigado" durante o depoimento.

Conhecido pelo hábito de falar dez vezes antes de pensar, Bolsonaro promete liberar a língua do cabresto num ato convocado para domingo, na Avenida Paulista. Com o microfone na mão, repetirá a tese segundo a qual a acusação de golpe é parte de uma grande perseguição política urdida com a participação de Lula.

Para comprovar a tese, Bolsonaro precisaria demonstrar que há um complô das revelações feitas pelo ex-escudeiro Mauro Cid com o vídeo da reunião em que expôs a trama golpista aos seus ministros, e duas dúzias de áudios e mensagens que expõem as conversas vadias de seus cúmplices militares e civis.

Contra esse pano de fundo, o silêncio meticulosa e medroso que se pretende exibir diante dos inquisidores da Polícia Federal grita mais alto do que o barulho valente programado para o carro de som. O interrogatório exigiria a exibição de fatos. No palanque, o orador não precisa de fatos. A empulhação já está pronta.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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