Algo está muito errado quando licitação certa vira suspeição
Nas pegadas do cancelamento de um contrato da Secretaria de Comunicação do Planalto e da anulação de um leilão para a compra de arroz, o Ministério da Saúde teve que suspender licitação de R$ 840 milhões para a compra de um lote de frascos de imunoglobulina, remédio usado no tratamento de cerca de 50 enfermidades, por supeita de superfaturamento. As empresas que participaram do certame apresentaram preços acima do valor de referência estipulado pelo governo.
Nova rodada da mesma licitação será realizada nesta quinta-feira. Farejando o cheiro de formação de cartel, o plenário do Tribunal de Contas da União autorizou, no ano passado, a pasta da Saúde a incluir na disputa empresas estrangeiras, que oferecem o medicamento a preços inferiores aos dos concorrentes nacionais. Importado, o remédio seria adquirido em valores 30% abaixo da cifra de referência fixada pelo governo.
Os fornecedores domésticos recorreram ao Supremo Tribunal Federal contra a decisão do TCU. Alegaram que o similar estrangeiro da imunoblobulina não dispõe de certificação da Anvisa. No mês passado, em decisão liminar proferida às vésperas das férias do Judiciário, o ministro Nunes Marques proibiu a aquisição do remédio importado.
Nesse contexto, a despeito dos riscos apontados pelo TCU, a segunda rodada da licitação flerta novamente com o fantasma da cartelização, eufemismo para combinação de preços entre os fornecedores. O Ministério da Saúde sustenta que segue a liminar do Supremo e a legislação brasileira. A ninguém ocorreu, por ora, acionar a Anvisa para que a agência analise a hipótese de certificar o medicamento fabricado no estrangeiro.
A encrenca da imunoglobina superfaturada chega depois de outras duas esquisitices licitatórias. Numa, o TCU obrigou a a Secretaria de Comunicação da Presidência da República a suspender contrato de R$ 197,7 milhões com empresas que cuidariam das redes sociais do governo. O resultado da tomada de preços foi exposto na imprensa antes da proclamação dos vencedores.
Noutra anormalidade, o governo anulou leilão para compra de 264 mil toneladas de arroz. Entre os vencedores havia empresas inaptas -uma loja de queijos e uma locadora de automóveis, por exemplo. Algo está muito errado quando processos licitatórios do governo federal tidos como absolutamente certos, descambam para a suspeição com inquietante frequência.
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