Josias de Souza

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Opinião

Lula convive com centrão, e não suporta direita extraparlamentar

Os milhares de eleitores que foram à Avenida Paulista para cultuar a ficha criminal de Bolsonaro representam algo novo para o governo: uma oposição extraparlamentar raivosa e influente. O pior erro que o governo pode cometer é ignorar o fenômeno. Lula se recusou a responder à pergunta de uma jornalista sobre o tema. O segundo pior erro é o menosprezo. O ministro Paulo Pimenta, chefe da Comunicação do Planalto, disse que "só deu vermelho" no domingo, pois "o Liverpool ganhou, o Inter ganhou e o Flamengo ganhou."

Pesquisa de opinião feita na Paulista por um grupo da USP, o Monitor do Debate Político no Meio Digital, ajuda a traçar um perfil dos devotos de Bolsonaro. A maioria da multidão era composta por homens (62%), brancos (65%), com ensino superior (67%) e renda entre três e dez salários mínimos (51%). Ou seja: o topo da pirâmide social brasileira desceu ao asfalto para santificar um mito do pau oco.

Esse Brasil privilegiado da Paulista é o mesmo que invadiu as sedes dos Três Poderes no 8 de janeiro: 88% dos manifestantes acham que foi Bolsonaro quem venceu a eleição presidencial, não Lula. Para 94% dos entrevistados, os alegados "excessos e perseguições da Justiça" caracterizam o Brasil como uma ditadura. Embora não tenha serventia jurídica para Bolsonaro, o ato da Paulista exibiu uma extrema-direita que já se incorporou à paisagem. Não decide eleição majoritária. Mas, somada ao pedaço civilizado do conservadorismo nacional, pode desempatar uma disputa equilibrada.

Não basta a Lula conviver com o centrão. É preciso superar a dificuldade de coexistir com a direita extraparlamentar. Dificilmente conseguirá repatriar o bolsonarismo que continua vivendo na Terra plana. Mas Lula ainda pode se reconectar com o pedaço racional da direita. O primeiro passo é enxergar que foi esse nicho conservador do eleitorado, não a sua coligação de esquerda, que decidiu a eleição de 2022. O segundo passo é reconhecer que o oxigênio da direita paleolítica é o antipetismo. Só Lula pode reduzir o suprimento de ar que mantém rival politicamente vivo.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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