Nunes X Boulos ganha ares de um ensaio para Tarcísio X Lula
Reunidos no Planalto nesta segunda-feira, Lula e seu staff político fizeram uma interpretação edulcorada das urnas do primeiro turno das disputas nos municípios. Concluíram que o passeio do centrão foi a vitória de uma hipotética "frente ampla" apoiada por Lula "contra a extrema direita". Coisa digna de Alice no seu País das Maravilhas.
Eleições municipais não definem disputas presidenciais. Mas emitem sinais de fumaça. Em 2020, a vitória de Bruno Covas em São Paulo sinalizou uma perda do fôlego adquirido pelo bolsonarismo na sucessão de 2018. Em 2022, Lula ganhou na cidade de São Paulo. Se Ricardo Nunes prevalecer sobre Guilherme Boulos, como indicam as pesquisas, Lula ficará menor do que Tarcísio de Freitas na capital paulista.
Enxergar na fumaça de 2024 uma maldição para 2026 seria um exagero. Ignorar os prenúncios seria uma tolice. Analisando-se as urnas do primeiro turno sob uma ótica nacional, verifica-se que o centrão fez barba, o PL fez cabelo e Tarcísio fez o bigode. A esquerda foi empurrada para o divã. Uma derrota de Boulos forçaria Lula a combinar a agenda de presidente com a atividade de psicanalista.
Na corrida pela Prefeitura de São Paulo, uma dúzia de partidos apoiam a candidatura de Nunes à reeleição. Cinco deles controlam em Brasília 11 ministérios e mais a Caixa Econômica Federal. MDB, PSD e União Brasil chefiam três pastas cada um. Republicanos, uma pasta. PP, um ministério e a Caixa. Todos dão de ombros para a bolsonarizaçao de Nunes.
Impulsionados pelo butim das emendas orçamentárias, maior cabo eleitoral da temporada, partidos do centrão e assemelhados —mais à direita do que ao centro— dominaram o primeiro turno. Juntos, conquistaram mais da metade das prefeituras do país.
O PSD, controlado por Gilberto Kassab, principal operador politico de Tarcísio de Freitas, registrou a maior variação absoluta. Ultrapassou o velho MDB. O Republicanos, partido do governador paulista, mais que dobrou o número de prefeituras. O PL de Bolsonaro, embora tenha perdido o topete com a derrota no Rio de Janeiro, obteve a terceira maior variação em número absoluto de prefeituras.
O PT também cresceu. Mas aparece em quarto lugar entre as legendas que mais conquistaram prefeituras. No ranking geral dos partidos, amarga, por ora, a nona posição. Juntando-se todos os sinais de fumaça chega-se a duas conclusões:
1) A pavimentação da candidatura presidencial de Tarcísio de Freitas passa pela unificação da direita tradicional e dos órfãos do bolsonarismo, ainda sujeitos à cooptação de bandoleiros digitais como Pablo Marçal.
2) Com Bolsonaro inelegível e Marçal a caminho da inelegibilidade, abre-se uma trilha para a construção de uma opção conservadora que tenha bons modos e saiba comer de garfo e faca. Tarcísio ocupa o primeiro lugar na fila do conglomerado do centrão.
No mundo da fantasia que vigora no Planalto, Lula é capaz de reformar a Esplanada para prestigiar o crescimento de uma serpente que jamais hesitou em calibrar o bote às suas conveniências. Confirmando-se a derrota de Boulos, a menos que convença a sociedade de que sua Presidência é uma experiência exuberante, Lula terá dificuldades insondáveis para obter um quarto mandato.
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