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Leonardo Sakamoto

Em meio à pandemia, ruralistas pressionam por MP que pode anistiar grilagem

Ricardo Moraes/Reuters
Imagem: Ricardo Moraes/Reuters

Colunista do UOL

07/05/2020 19h39

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Representantes do agronegócio na Câmara dos Deputados tentam aprovar a Medida Provisória 910/2019 em meio à crise sanitária e econômica causada pelo coronavírus. Para o governo e bancada ruralista, ela vai botar ordem no caos fundiário, mas organizações da sociedade civil, Ministério Público Federal e parte do empresariado afirmam que a nova lei irá premiar o roubo de terras públicas.

Deputados da oposição afirmaram à coluna que a pressão dos ruralistas vem crescendo à medida que se aproxima o prazo de validade da MP: 19 de maio. Para que ela seja aprovada até lá, prometem corte de alguns pontos polêmicos, como o que permite que imóveis invadidos recentemente possam ser anistiados. Mas, segundo eles, não há acordo para que a matéria seja colocada em votação.

O prazo exíguo de matéria importante para um dos pilares de sustentação de seu governo levou o presidente da República ir às redes sociais, nesta quarta (6), estimular sua militância a pressionar os deputados a votá-la. "Colocá-la em votação, e NÃO DEIXÁ-LA CADUCAR, é um compromisso com a dignidade desses produtores (rurais) e com o desenvolvimento do nosso Brasil", postou Jair Bolsonaro. As letras maiúsculas são dele.

Isso ocorre em meio à perda de influência de Rodrigo Maia (DEM-RJ) junto ao centrão com a distribuição de cargos pelo governo federal para ampliar sua base de sustentação. De acordo com os deputados ouvidos, nesse contexto, o presidente da Câmara tende a ficar mais sensível à demanda da bancada ruralista.

Por outro lado, um gestor de um parrudo fundo de investimento que se guia por princípios de sustentabilidade e está sediado em um país europeu demonstrou preocupação à coluna com os impactos da nova lei.

Pedindo anonimato, ele lembrou que empreendimentos brasileiros voltaram a ser preocupação após aumento no desmatamento e nas queimadas na Amazônia no ano passado - tendência que se mantém em 2020. E uma mudança dessa forma no marco legal pode levar ao perder dinheiro, não com barreiras impostas por outros países, mas com desinvestimento pelo setor privado.

A regularização fundiária é apontada pela sociedade civil, empresários, governo e pesquisadores como condição fundamental para organizar o território e reconhecer o direito das pessoas que a ocupam terras de boa fé. Ela reduz assassinatos de posseiros, extrativistas e camponeses e ajuda na punição a quem se utiliza de trabalho escravo ou desmatamento, uma vez que saber quem é o dono da terra é condição para que ele e seus produtos possam ser responsabilizados.

Nisso há consenso. O problema é que muita gente invade terras públicas para desmatar, esquentar e vender depois.

Os críticos à MP 910/2019 afirmam que ela representará anistia para quem desmatou e vendeu grandes áreas de terras públicas recentemente.

O ponto mais polêmico é da vistoria prévia. Atualmente, a regularização é simplificada para áreas de até quatro módulos fiscais, o que pode chegar a 440 hectares na Amazônia. Isso beneficia camponeses e pequenos posseiros. Mas há propostas que permitem que a vistoria prévia seja desnecessária para áreas entre 1650 e 2500 hectares, facilitando a vida de quem roubou patrimônio da população para especulação imobiliária.