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Leonardo Sakamoto

Milícia deve ser apontada como mandante da morte de Marielle, diz Freixo

Colunista do UOL

08/12/2020 06h55

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Os assassinatos da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes completam 1000 dias, nesta terça (8), sem que os acusados de executarem o crime tenham ido a julgamento e sem que o mandante das mortes tenha sido revelado. Eles foram emboscados no carro em que estavam, na noite de 14 de março de 2018, na região central do Rio.

O deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ), que está acompanhando de perto a investigação, afirmou, em conversa com a coluna na semana passada, que a tendência é que milicianos sejam apontados como os responsáveis.

"Milicianos como mandantes. A tendência é que peguem os responsáveis por isso, num processo de retaliação pelo enfrentamento às milícias feito por nós", afirma.

Os assassinatos teriam ocorrido por "vingança política" devido ao trabalho do grupo de Marielle e Freixo no combate a essas organizações criminosas, formadas por profissionais oriundos da polícia e das Forças Armadas.

"As investigações já estão bem avançadas, eles já têm convicção. Mas convicção não é suficiente para condenar ninguém, por mais que esse país já tenha visto o contrário. Eles estão produzindo provas", explica o deputado federal. "A convicção passa, evidentemente, por ações da milícia do Rio de Janeiro como mandante."

A Polícia Civil e o Ministério Público do Rio afirmam que os executores foram o policial militar da reserva Ronnie Lessa, acusado de ter feito parte de um grupo de matadores de aluguel, e o ex-PM Élcio Vieira de Queiroz. Eles estão presos desde março de 2019, aguardando o tribunal do júri.

Território controlado

A tendência apontada por Marcelo Freixo, de que milicianos, ou seja, agentes ou ex-agentes de segurança pública, podem ter sido os responsáveis por ordenar o assassinato de uma representante eleita, liderança negra e LGBTQI+, nascida em uma das maiores favelas do Rio, é sinal de falência estatal.

Caso isso se confirme, pessoas que receberam treinamento militar pelo poder público, e com ele mantém relações incestuosas, terão ordenado a execução da quinta vereadora mais votada de nossa segunda maior cidade e voz de várias minorias historicamente sub-representadas.

Ao mesmo tempo, diante da espera pela solução não só do caso de Marielle e Anderson, mas de tantas outras mortes de mulheres, pessoas negras, de origem pobre, defensores de direitos humanos, o Estado brasileiro envia uma mensagem silenciosa, de que há categorias de matáveis.

Essa sensação de impunidade torna mais fácil a morte de crianças negras e pobres como "efeito colateral". As primas Emilly, de 4 anos, e Rebecca, de 7, foram as últimas duas vítimas dessa percepção, mortas por um tiro de fuzil, na sexta (4), enquanto brincavam na frente do portão de suas casas em Duque de Caxias (RJ).

Testemunhas dizem ter visto policiais atirando antes das meninas tombarem - a PM nega. Emilly foi enterrada vestida de Moana, a personagem da Disney - fantasia que usaria na primeira festa de aniversário de sua vida.

O recado que o país enviou à sua população com a morte de Marielle é que os mais pobres, que já veem negados seus direitos sociais, econômicos, culturais e ambientais, não devem esperar respeito por seus direitos civis e políticos. Pois seus representantes são descartáveis e podem ser executados tanto por sua atuação, quanto para servirem de recado. Isso sempre foi comum em alguns locais no interior do Brasil em que não se sabe onde termina a fazenda e começa a prefeitura. Agora, também é no Rio.

A capital fluminense tem dono e não é a esmagadora maioria da população honesta que nele habita. "Quem manda na cidade não é o prefeito, mas a milícia. Um em cada três moradores vive em área de milícia", afirmou Freixo na mesma conversa. "Quem manda na cidade é quem controla os territórios."