Congresso tornou-se sócio do coronavírus ao permitir inação de Bolsonaro
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O Brasil registrou mais 1.379 mortes por covid-19, nesta sexta (8), um dia após ter ultrapassado o patamar de 200 mil óbitos - agora estamos em 201.542 óbitos. Ambos os números tendem a continuar crescendo, considerando que as aglomerações de Natal e Ano Novo apenas começam a chegar às estatísticas.
Enquanto isso, os Estados Unidos ultrapassaram a marca de 4 mil mortes diárias pela doença, também com tendência de alta. Na saúde e, principalmente, na doença, o alinhamento de Jair Bolsonaro a Donald Trump é uma das coisas mais sólidas de sua gestão.
Apontar a responsabilidade do presidente da República e do seu ministro da Saúde pela falta de ações para combater a doença e imunizar rapidamente a população tornou-se repetitivo e inútil. Ele não vai mudar e qualquer pessoa capaz de sentir empatia não deixará de se revoltar.
Bolsonaro deixou claro que está mais interessado em proteger a si mesmo e a seu filho primogênito, denunciado por desvio de recursos públicos. E o general Eduardo Pazuello está mais preocupado em agradar o chefe para não perder o posto. Isso seria indigno para um militar de alta patente. Mas o atual governo, ao sujeitar o Exército às suas necessidades, redefiniu o significado de muitas palavras.
Quanto mais negacionista e anticiência for o comportamento presidencial, mais o naco bolsonarista-raiz, que representa cerca de 16% da população, segundo o Datafolha, vai apoiá-lo. Além de ir à rua pedir autogolpe militar e agredir jornalistas, essa parcela não tem pudor de exigir o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal em nome do mito, como ocorreu no primeiro semestre de 2020.
Tendo em vista a rebordosa estrutural em que nos encontramos, a responsabilidade pelo caos sanitário também deveria ir para a conta de deputados e senadores.
Por mais que o Congresso tenha aprovado medidas importantes, como o auxílio emergencial, obrigando Bolsonaro a subiu o valor do benefício pago aos mais pobres, ele também manteve o presidente livre para brincar com a vida de milhões de pessoas.
Diante de um governante que não demonstrou interesse de agir em nome da saúde pública, poderiam ter votado por seu afastamento. Mas uma parte significativa dos parlamentares ficou satisfeita com a ideia de "Nova Política" proposta por Bolsonaro. Ou seja, uma relação fisiológica de compra e venda de apoio, fantasiada de republicanismo para enganar eleitor que gosta de ser enganado.
E, sob a justificativa de que um pedido de impeachment não prosperaria nesse contexto, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não colocou dezenas deles para apreciação.
Como também temos um procurador-geral da República escolhido por Bolsonaro fora da lista tríplice de votados e que muito provavelmente não levaria adiante uma denúncia contra ele, fica tudo como está.
No início da pandemia, muitos disseram que seria traumático o país começar um processo de cassação no momento que o parlamento precisava se concentrar em políticas para aliviar a situação econômica dos trabalhadores que ficariam sem renda diante do isolamento social. A questão é que a permanência do presidente custou ainda mais vidas e empregos do que poderíamos imaginar.
Outros afirmaram que a abertura de um processo levaria o presidente a se vitimizar, aumentando o apoio a ele e gerando manifestações de rua em seu nome. Contudo, os protestos aconteceram de qualquer forma, contando, inclusive, com a participação do próprio em protesto que pediu novo Ato Institucional número 5. Sem contar que membros do STF foram ameaçados e a corte foi atacado com fogos de artifício.
Dez meses após o registro da primeira morte, podemos afirmar que o vácuo de ações do governo federal não foi apenas incompetência, mas um projeto. Um projeto nacional com sócios nos Três Poderes.