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Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Após causar aglomeração, Bolsonaro diz que ciência não respalda quarentena

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Imagem: Shutterstock

Colunista do UOL

22/05/2021 11h35

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Jair Bolsonaro foi um passo além na sabotagem que vem realizando ao combate à covid-19. Nesta sexta (21), em um evento em Açailândia (MA), mentiu sem pudores ao dizer que medidas de isolamento social "não têm qualquer comprovação científica". Sim, no fundo do poço, há sempre um alçapão.

Ele se referia às decisões de restringir tanto a circulação de pessoas quanto o funcionamento do comércio adotados pelo governador Flávio Dino, chamado por Bolsonaro de "ditador". O Maranhão foi o primeiro a baixar um bloqueio total, o chamado lockdown, em maio do ano passado.

Considerando número atualizados até esta sexta, o Estado ostenta a menor taxa de mortes por covid por 100 mil habitantes (110,36), bem menos que a segunda colocada, a Bahia (135,83). O pior Estado nesse quesito, Rondônia, conta com 311,11 mortos/100 mil habitantes, com o Amazonas logo atrás (306,86).

Preocupado que uma economia deprimida possa prejudicar suas chances de reeleição, Bolsonaro vem atacando medidas de restrição social desde o início da pandemia. Em contrapartida, defende o contágio rápido da população como forma de fazer o vírus parar de circular. O efeito colateral da estratégia são mortes.

O Brasil nunca conseguiu controlar o coronavírus. Ao invés de ser parte da solução, o presidente vem sendo um do principais causadores do problema, estimulando o desrespeito às quarentenas, provocando aglomerações desnecessárias e se omitindo sob a justificativa mentirosa de que o Supremo Tribunal Federal mandou o governo ficar fora da articulação da política de combate à covid.

O resultado disso é que prolongamos desnecessariamente a pandemia, ficando em um constante abre e fecha da economia - o que é menos eficaz para salvar vidas e empregos do que os fechamentos duros e curtos adotados em países como a Nova Zelândia.

Bolsonaro percebeu que a conta está caindo em seu colo e resolveu fazer pré-campanha eleitoral em locais como Açailândia. E praticar um dos esportes que ele mais gosta, o Arremesso de Responsabilidade à Distância.

"Quero dizer a todos do Maranhão aqui que perderam seus empregos, não foi obra do governo federal. Quem fechou o comércio, obrigou vocês a ficar em casa e destruiu milhares de empregos foi o governador do seu estado", falou no evento.

Para ele, as medidas de restrição social são "apenas uma demonstração de força, de que ele [Flávio Dino] pode oprimir o povo, que ele pode escravizar o povo e depois dizer que estava defendendo sua vida".

Parte do caos social de origem econômica é de responsabilidade de Bolsonaro também por ter interrompido o pagamento do auxílio emergencial em 31 de dezembro do ano passado e começado a retomá-lo apenas em 6 de abril. E, ainda assim, em um valor insuficiente para a sobrevivência. As novas parcelas são de R$ 150, R$ 250 ou R$ 375 mensais.

No último trimestre do ano passado, quando o auxílio emergencial já havia sido reduzido de R$ 600/R$1.200 para R$ 300/R$ 600, a fome atingia 9% da população, a maior taxa desde 2004. De acordo com pesquisa da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional foram 19,1 milhões que passaram fome em um universo de 116,8 milhões que conviveram que não tiveram acesso pleno e permanente à comida.

Imagine a situação com a pausa de 96 dias no pagamento.

Um dos momentos mais sinceros na sopa de mentiras servida pelo general Eduardo Pazuello na CPI da Covid, entre quarta e quinta, foi quando ele disse que o Brasil não segue necessariamente recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS).

"O Brasil é soberano para tomar suas decisões em qualquer área, inclusive saúde", afirmou o ex-ministro. Baseada em muita comprovação científica, a OMS recomenda o isolamento social e o uso de máscara para mitigar a covid, medidas que Bolsonaro ignora.

No dia 17 de abril, sem máscara, interagindo com fãs e mandando às favas qualquer cuidado sanitário, o presidente promoveu mais uma aglomeração, dessa vez em Goianópolis (GO). Levou a tiracolo um sorridente Pazuello.

Jair acabou multado nesta sexta por não usar máscara em local coletivo e por provocar aglomeração em Açailândia. O que deveria ser um fato óbvio e previsível, pois ninguém está acima da lei, tornou-se notícia em veículos de comunicação de todo o país. Afinal, até agora, ele faz o que quer. Inclusive pisar na saúde da população em busca de sua reeleição.