Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Bolsonaro ameaça piorar o Brasil, mas votações da Câmara já fazem isso
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Enquanto o presidente Jair Bolsonaro está ocupado minando a credibilidade do sistema eleitoral com mentiras sobre a urna eletrônica e preparando terreno para um golpe de Estado caso não seja reeleito no ano que vem, o Congresso Nacional está passando uma "boiada" ambiental, trabalhista, política e eleitoral através de votações de leis que também têm potencial para mudar a cara do Brasil para pior.
Com a atenção voltada ao açoitamento público da democracia por Bolsonaro, as revelações da CPI da Covid (mostrando que a pizza de sabotagem do combate à pandemia foi meia negacionismo, meia corrupção) e os Jogos Olímpicos, fica difícil acompanhar tudo o que fazem os parlamentares.
Por exemplo, a Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça (3), por 296 votos a 136, o projeto de lei que facilita a anistia de quem roubou patrimônio público. Sob a justificativa de ajudar na regularização fundiária de terras da União, o PL 2633/2020 dispensa a vistoria de parte dos imóveis (bastando uma autodeclaração) e permite a regularização de áreas desmatadas ilegalmente, um convite ao crime. Será analisado ainda pelo Senado Federal.
Uma Medida Provisória criada para ajudar empresas durante a pandemia ganhou um rosário de emendas que podem cortar proteções trabalhistas, reduzir a renda dos trabalhadores, criar categorias de empregados de "segunda classe", reduzir pagamentos a jovens e até atrapalhar a fiscalização de escravidão contemporânea. A MP 1045 estava para ser analisada nesta terça pelo plenário da Câmara, mas foi adiada por alguns dias.
Enquanto isso, um novo Código Eleitoral avançou a toque de caixa na Câmara dos Deputados. O problema não é a reforma do sistema, que precisa ser atualizado, mas fazer isso sem o devido debate com a sociedade. Reduzir direitos de candidatas mulheres e candidatos negros, abrandar a responsabilização por problemas nas contas partidárias, dificultar a punição por compra de voto e dar poder ao Congresso para cassar decisões do TSE, entre outros pontos, não é o que podemos chamar de "atualização"
Isso sem contar a tentativa de aprovar o "distritão", em que apenas os mais bem colocados são eleitos, reduzindo a importância dos partidos políticos. Hoje, a eleição de deputados e vereadores é pelo sistema proporcional (em que o voto em um candidato também é computado ao seu partido, podendo ser útil para eleger outro nome na mesma agremiação). A mudança afeta a vida das minorias, favorece a candidatura de "celebridades" e dificultando o ingresso na política de novos quadros.
Esses projetos estão para ser votados na Câmara, sendo que a proposta de emenda à Constituição do "Distritão", modelo adotado no Afeganistão, na Jordânia e em uma série de micropaíses, tem resistência pelo risco de esfacelar o sistema partidário.
Outra PEC que ganhou os holofotes é a que introduz o voto impresso. A discussão não é nova, mas Jair Bolsonaro a transformou em bandeira, afirmando que só ele será a garantia de que as eleições de 2022 não serão fraudadas. E ameaça que, se a medida não for aprovada, não haverá eleições - apesar de não haver provas de que a urna eletrônica tenha sido fraudada. Quer a impressão, na verdade, para poder criar confusão nas eleições e justificar o tal golpe.
Ironicamente, a ameaça do ministro da Defesa, general Braga Netto, ao Congresso Nacional pela aprovação do voto impresso praticamente enterrou o seu trâmite nesta legislatura.
O centrão fará de tudo para manter seu hospedeiro vivo porque só tem a ganhar com isso. Ao mesmo tempo, Bolsonaro se mantem vivo graças ao centrão, que garante apoio político para que nenhum dos 132 pedidos de impeachment prospere. Ele cede cargos, emendas e garante apoio na aprovação de leis e tende a pedidos de mudanças em portarias e normas que interessem ao centrão e seus representados, mesmo que em prejuízo do restante da sociedade. Um exemplo clássico de simbiose, em que o parasitado é quem não foi chamado para a festa.