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Negócio bilionário de escavadeiras bomba garimpo ilegal em terras indígenas
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A força-tarefa do governo federal para retirar garimpeiros do Território Indígena Yanomami destruiu ontem escavadeiras usadas para ajudar na extração de ouro. E muitas outras virão. Onipresentes nos garimpos ilegais, esses equipamentos representam um negócio próspero e lucrativo na Amazônia. Governo, fabricantes e revendedores vêm sendo cobrados para aumentar o controle de venda e uso a fim de evitar que sejam empregadas como armas contra indígenas e o meio ambiente.
Esse tipo de equipamento torna muito mais fácil e rápido o trabalho de abrir crateras para buscar o metal, fazendo em menos de uma semana o serviço que levaria mais de um mês. Uma escavadeira remove a camada superior de terra a fim de que o garimpo use jatos d'água e bombas de sucção de lama para revolver o subsolo. Considerando que é uma atividade ilegal, que pode ser flagrada por forças de segurança, tempo é tão precioso quanto o ouro retirado.
Após reclamação de garimpeiros que atuavam em terras indígenas, parte de sua base eleitoral, o ex-presidente Jair Bolsonaro ameaçou fiscais do Ibama para que parassem de destruir máquinas flagradas nesses locais. Ou seja, para que deixassem de cumprir a lei. Mesmo assim, agentes apreenderam e destruíram dezenas de escavadeiras hidráulicas e pás-carregadeiras em terras indígenas e unidades de conservação nos últimos anos.
Além dos yanomamis, a fiscalização também encontrou, de 2016 a 2021, escavadeiras remexendo a terra em busca de ouro nas terras indígenas Munduruku, Sai Cinza, Cachoeira Seca, Arara, Tenhariam do Igarapé Preto, Kawahiva do Rio Pardo, Kaxarari, Karipuna, Karitiana, Sete de Setembro, Roosevelt, Cinta Larga, Aripuanã, Rio Mequéns, Paukalirajausu, Sararé, Apiaká-Kayabi, Baú, Apyterewa, Kayapó, Bacurizinho e Trincheira Bacajá, segundo levantamento da Repórter Brasil.
O Ibama aponta que foram apreendidas máquinas de Hyundai, Caterpillar, Case, Sany, LiuGong, Link Belt, Komatsu, Valmet, New Holland, John Derre, JCB, Fiatallis, XCMG, Volvo, Sumitomo, SDLG, Lonking e Hitachi nesse período.
Há uma relação conhecida entre veículos usados na construção civil da chamada linha amarela, que envolve escavadeiras hidráulicas, retroescavadeiras, pás-carregadeiras, tratores de esteira, motoniveladoras, rolos compactadores, minicarregadeiras e o garimpo ilegal em terras indígenas e unidades de conservação.
Não à toa, Itaituba, no Pará, um dos principais mercados do ouro ilegal extraído não apenas no estado, mas também no Amazonas e em Roraima, conta com grandes revendas de marcas internacionais como Hyunday, Caterpillar e John Deere. Enquanto isso, cidades bem maiores não possuem lojas como essas. Na mesma cidade, oficinas mecânicas estão lotadas desses equipamentos. Consertam inclusive produtos que foram destruídos pelo Ibama.
O Ministério Público Federal vem exortando o governo federal e os fabricantes dessas máquinas a garantirem responsabilidade a esse negócio, adotando mecanismos mais rigorosos para a sua venda.
A criação de um cadastro técnico federal que credencie e acompanhe o uso desses equipamentos na mineração é um passo. O sistema financeiro também precisa cobrar mais informações dos compradores do que é exigido hoje - as máquinas, vendidas por R$ 1 milhão, não raro são financiadas.
Há também como usar a tecnologia. Parte desses equipamentos sai de fábrica com GPS incorporado ao sistema. Por isso, seria possível instalar uma trava nesses veículos para que fossem automaticamente desligados caso entrassem em terras indígenas e áreas de conservação.
A questão é saber quais empresas estão realmente interessadas em manter um negócio social e ambientalmente responsável. Ou quem só quer ganhar dinheiro.