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Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonarismo vai mentir na CPMI do Golpe para se manter forte até a eleição

Colunista do UOL

25/04/2023 09h53

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Jair Bolsonaro colocou a História no pau de arara até que ela gritasse o que ele desejava ouvir em seus anos como presidente. Hitler? De esquerda. Ditadura? Nunca existiu. Agora, na véspera da instalação da CPMI do Golpe, bolsonaristas esperam poder torturar os fatos mais uma vez para transformar carrasco em vítima junto ao eleitorado.

Até um pônei com problemas de cognição sabe que a comissão não deve alterar o curso das investigações tocadas pela Polícia Federal, muito menos as decisões de Alexandre de Moraes, à frente do caso no STF. Pelo contrário, a tendência é que o ministro seja mais rigoroso quando a CPMI agir como centro difusor de desinformação.

Além disso, a extrema direita tem plena consciência de que não terá vida fácil com a maioria dos jornalistas - que registrou, durante anos, a preparação do 8 de janeiro. Bolsonaro nunca escondeu seu golpismo, pelo contrário, ameaçou que a invasão do Congresso norte-americano seria fichinha se comparado ao que aconteceria por aqui.

Difundiu que as urnas eletrônicas eram corrompidas e manipuladas em nome de Lula, usou técnicos das Forças Armadas para tentar colocar em dúvida a lisura da corte, transformou os chefes do TSE (Luís Roberto Barroso e, depois, Alexandre de Moraes) em alvos de seu rebanho, colocou embaixadores estrangeiros em uma espécie de "cercadinho" para atacar o sistema eleitoral brasileiro. Armou seus seguidores através de decretos. Conclamou todos a pegarem em armas.

Qualquer veículo de comunicação que, durante a CPMI do Golpe, se limitar a transmitir de forma acrítica teses estapafúrdias que tentem reescrever a História será visto como correia de transmissão de quem ataca a democracia. Pois vale não confundir busca por imparcialidade com tolerância à sedição.

A atuação da extrema direita na comissão, que visa a bombar a mentira de que infiltrados petistas transformaram um movimento pacífico em terrorismo, quer influenciar quem já nutre simpatia pelo ex-presidente. E, dessa forma, ajudar a manter a força do bolsonarismo até o próximo ciclo eleitoral.

Pesquisa Datafolha do início deste mês apontou que 39% não veem nenhuma responsabilidade de Jair Bolsonaro pelos atos golpistas de 8 de janeiro. Enquanto isso, 58% dizem que ele teve sim responsabilidade, dos quais 26% afirmam ter sido pouca. A margem de erro é de dois pontos.

São esses 39% e, quem sabe, esses 26%, sem contar os 3% que não souberam responder que os parlamentares bolsonaristas querem atingir. Cada mentira contada por um aliado do ex-presidente será convenientemente editada e transmitida pelas redes sociais e aplicativos de mensagens para tentar chegar a esse público.

Eles não precisam convencer o bolsonarismo-raiz, que aceita qualquer comando que venha de cima como o rebanho que atende ao berrante. Para esse grupo, a CPMI vai apenas gerar munição para a guerra que continuam a desempenhar nas redes sociais, tentando evitar uma redução no Bolsoverso, o universo paralelo bolsonarista.

Mas o conteúdo a ser espalhado nas redes pode servir para reforçar os demais que não veem responsabilidade de Jair ou produzir uma dúvida razoável entre aqueles que acreditam que ela foi pouca. Somando os dois grupos e os que não responderam, dá 68%. Não é pouca coisa.

Do outro lado, o campo democrático terá a tarefa de relembrar o óbvio. Que milhares de horas de gravação, centenas de depoimentos de golpistas, financiadores e incitadores presos, documentos, declarações e confissões provam que o 8 de janeiro foi bolsonarista.

Tentar reescrever a História disso é, ademais, uma injustiça diante de um político que sempre foi acusado a ter alergia para trabalhar. O 8 de janeiro é obra de Jair, e ele precisa ser reconhecido por isso.