Como povo não come meme, Lula e Haddad miram 2026 de olho no arroz e feijão
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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está levando uma surra de memes nos últimos dias, vinculando-o ao aumento de taxas e impostos. Isso ocorre no momento em que a "taxa das blusinhas" sobre compras de plataformas chinesas foi aprovada pelo Congresso e o processo de reoneração de setores que recebem benefícios fiscais é discutida.
Muito se falou a respeito de como o ministro e o governo Lula deveriam lidar com os memes. Há quem defenda desmenti-los, outros, responder na mesma moeda, e tem o pessoal que prefere ignorar e fazer de conta que nada aconteceu. Particularmente, minha experiência mostra que a melhor saída é, na medida do possível, rir junto, ou seja, de si mesmo e da situação. Demanda sangue frio, mas é a melhor redução de danos.
Memes são uma evolução da charge política dos jornais, com muito mais poder porque atinge milhões de pessoas quase que instantaneamente e podem ser produzidos aos borbotões. Dificilmente a distribuição desse tipo de mensagem seria, portanto, penalizada mesmo se a Câmara dos Deputados não tivesse sentado em cima da regulamentação das redes sociais.
Qual seria a alegação? Excesso de crítica? Porque a atual onda é diferente de distribuir mentiras como a da "mamadeira de piroca" ou imputar crimes a Haddad, como o bolsonarismo fez de forma tresloucada nas eleições presidenciais de 2018.
Apesar de esse ataque memético atingir a imagem do ministro e do governo junto a uma parte da população e excitar o núcleo duro da extrema direita, o que fará diferença na eleição de 2026 - seja em termos de Lula tentar a reeleição ou apontar Haddad como seu sucessor - será o preço do arroz e do feijão na feira e no supermercado.
Tachar o ministro de taxador pode perder o efeito diante da percepção de melhora na qualidade de vida.
A força de um governo não depende apenas de indicadores econômicos, pois, como disse a saudosa Maria da Conceição Tavares, o povo não come PIB, mas alimentos. Lula conseguiu aumentar o Produto Interno Bruto e a renda média dos trabalhadores e reduzir a taxa de desemprego, mas nada adianta se isso não vier com a percepção de melhora na qualidade de vida. E, para tanto, o poder de compra é central. Arroz e feijão baratos, em suma.
O ataque dos memes vem, coincidentemente, em um momento em que a população avalia que o preço dos alimentos parou de subir e começou a cair, o que foi registrado por pesquisa Genial/Quaest.
Em agosto do ano passado, 37% avaliavam que o preço da comida nos mercados havia subido no último mês. A taxa chegou a 73% em fevereiro deste ano e ficou estável em maio. Agora, está em 70%. Enquanto isso, o total dos que avaliam que o poder de compra piorou de um ano para cá caiu de 67% para 63%, enquanto os que acham que melhorou oscilou de 19% para 21%. É pouco, mas o incômodo começou a cair.
Há um naco grande da população, que não está polarizado entre lulistas e bolsonaristas, e que foi fundamental para eleição de Lula. Esse grupo, de comportamento pendular, pode tanto se conectar ao discurso de costumes e comportamentos de Jair, quanto às promessas de melhor qualidade de vida e conforto econômico de Luiz.
Esse grupo, que foi com Lula, quer ver resultados, e tem pressa porque tem necessidade. A melhora na economia veio junto com o aumento nos preços (por exemplo, o arroz disparou mais de 30% nos últimos 12 meses segundo o IPCA, sem contar com impacto que ainda deve vir pela tragédia das chuvas no Rio Grande do Sul). É como se a felicidade do trabalhador pelo aumento no salário desaparecesse no momento em que ele pagar os boletos e fazer suas compras. Com o freio no avanço dos preços, as coisas mudam.
(Ironicamente, a picanha, promessa de campanha de Lula, foi no sentido contrário e caiu 5% em 12 meses. As carnes como um todo caíram 6,5%.)
Essa percepção na melhora da qualidade de vida, que começa a ser refletida nas pesquisas, aumenta a força de Lula no processo eleitoral de 2026, mas também no de 2024. Um presidente que recupera parte de sua popularidade, principalmente junto à massa mais pobre, é mais requisitado como padrinho. Afinal, o povo não come meme.