SP respira ar podre enquanto candidatos brigam sobre fumaça bolsonarista
O ar de São Paulo está podre nesta semana, causando doenças, trazendo dor, reduzindo a expectativa de vida. Ontem e hoje, a capital paulista registrou o pior ar do mundo entre grandes cidades. Isso seria o bastante para a questão se tornar a principal pauta na eleição paulistana - ao lado de o risco de o PCC chegar ao poder, claro.
Mas o assunto que mais anima o eleitorado nas redes é a briga entre Pablo Marçal (PRTB) e Ricardo Nunes (MDB) para ver quem representa de fato o bolsonarismo em São Paulo.
No centro do furdúncio, a discussão sobre a autoria de uma bandeira brasileira com a frase "Bolsonaro parou. Marçal começou. Pablo Marçal presidente do Brasil", estendida na avenida Paulista durante o ato bolsonarista no último sábado (7). A irritação de Jair levou Marçal a dizer que ela foi feita por Nunes para criar intrigas, o prefeito disse que levaria o caso à polícia.
Enquanto as redes discutem uma grande cortina de fumaça, que coloca Bolsonaro como objeto de desejo de dois candidatos tecnicamente empatados em primeiro lugar, fumaça de fato entra em nossos pulmões. Seja a vinda de incêndios em plantações e florestas no interior do Estado, mas também aquela que vem da queima da Amazônia e do Pantanal.
São Paulo está alternando entre tragédias envolvendo chuva e fogo. Entre o final do ano passado e início deste ano, sofremos com o despreparo da cidade e da empresa de fornecimento de energia elétrica para tempestades bombadas pelas mudanças climáticas. Milhões ficaram no escuro. Agora, uma nuvem de fumaça cobre a capital, vinda de incêndios criminosos.
Em outubro, teremos eleições para escolher prefeitos e vereadores. Mas, infelizmente, a questão das mudanças climáticas ocupa menos espaço nas campanhas e debates eleitorais do que o terrorismo do Hamas no Oriente Médio e a preocupação com a autocracia de Nicolás Maduro na Venezuela. Ou as macaquices ideológicas da extrema direita.
A administração da Ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, tem reduzido as taxas de desmatamento, conforme mostram os dados do (Inpe) Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. No entanto, com um sistema de monitoramento que foi desmantelado durante o governo Jair Bolsonaro, com um Congresso Nacional que se opõe a medidas que poderiam conter a devastação, e com um governo Lula que não só evita confrontar a facção reacionária da produção nacional como também pressiona pela exploração de petróleo na costa oceânica amazônica, ela e sua equipe não farão milagres.
Diante de tudo isso, torna-se ainda mais grotesco que o tema esteja praticamente ausente nas eleições municipais.
Seja nos debates televisivos, nas brigas de rua nas grandes cidades ou na propaganda eleitoral, a impressão é que em outubro escolheremos um Ministro das Relações Exteriores ou um Secretário-Geral da ONU, e não alguém para lidar com os problemas do território em que vivemos.
Aqueles que desejam ganhar ou manter o poder devem ser responsabilizados pelo que planejam fazer para evitar desastres - que, não raro, são vistos como apenas "naturais" na complacência da mídia. Hoje, esse tipo de tópico é um dos primeiros a perder recursos no orçamento quando há necessidade de atender às demandas de aliados.
Não só. Candidatos precisam dizer como vão adaptar nossa economia para esse novo mundo. Por exemplo, parte da madeira extraída da Amazônia vem para a construção civil do estado e somos grandes consumidores da carne bovina e de matérias-primas produzidas por lá, como minérios e soja. Atividades conectadas com desmatamento e queimadas. Sem contar que hidrelétricas são construídas, impactando o clima, para nos abastecer de energia.
Ao mesmo tempo, milhões de escapamentos de nossos carros, motos e caminhões pioram o efeito estufa, enquanto o aumento da malha de transporte de massa sobre trilhos segue devagar quase parando. E temos uma cobertura vegetal pequena e malcuidada em comparação ao nosso tamanho. São Paulo é vítima do clima, mas também seu algoz.
Há candidatos que não têm ideia do que dizer sobre mudanças climáticas. E evitam falar sobre medidas que possam soar impopulares para seus públicos — como remover famílias de áreas de risco e dizer não ao comportamento predatório de setores da agricultura, extrativismo vegetal, indústria de petróleo e setor imobiliário, que operam sob a lógica de "o clima mudou, mas ainda há tempo". Mas não há tempo.
Para uma parte do eleitorado, parece mais importante que os candidatos a prefeitos e vereadores entreguem entretenimento de baixa qualidade nas eleições. A realidade que sufoca, queima, inunda e mata? Isso não importa. O povo quer ser entretido nas redes porque, para uma parte, "todos são iguais". Como já disse aqui, a realidade só vai se impor quando não houver eletricidade para carregar o telefone.