Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Bolsonarismo tenta se descolar de seu candidato a mártir, Roberto Jefferson
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Numa eleição que será decidida pela rejeição dos indecisos, o quase mártir do bolsonarismo, Roberto Jefferson, é um material radioativo. A tentativa de instaurar o caos e se oferecer em sacrifício pela liberdade de expressão foi bem até ele atirar na Polícia Federal.
A campanha de Jair Bolsonaro poderia simplesmente ter surfado no fato político criado pela retirada de conteúdos online, que levou a uma febre de protestos contra a censura. Agora vai passar a última semana tentando convencer moderados de que não apóia terrorismo e barbárie.
Por mais violento e absurdo que seja, o episódio de Roberto Jefferson não abala o bolsonarismo raiz. Aliás, esta ala já tem narrativas interessantíssimas para explicar o absurdo ocorrido no final de semana.
O presidente Jair Bolsonaro calou de forma eloquente diante do vídeo de quinta categoria xingando a ministra Cármen Lúcia de tudo quanto é nome.
Ironia do destino, essa foi a razão de levar Roberto Jefferson novamente à prisão. Poderia ter sido o arsenal de armas e explosivos que um preso em regime domiciliar guarda na própria residência. Inacreditável que não tenha sido, desnuda a esculhambação em que nos convertemos.
Depois de ameaçar diversas vezes fazer ações armadas e mostrar as armas, o ex-deputado acabou em regime de prisão domiciliar. Ficou lá sentado num arsenal sem que ninguém mexesse um dedo. Não fosse o vídeo, estaria lá até agora. Pior, até o dia das eleições.
Jair Bolsonaro jogou Roberto Jefferson debaixo do ônibus. Chamou de bandido com todas as letras. Foi a senha para o início de narrativas bolsonaristas que descolem os dois.
A primeira e mais óbvia é a de que se trata de um infiltrado petista na campanha. Digo óbvia não porque tenha algum sentido, mas porque é a mais fácil de mandar adiante. Ela segue junto com uma foto de Jefferson, Lula e José Dirceu.
Já faz parte da cultura das redes sociais avaliar uma pessoa por meio de qualquer foto. Diante de qualquer situação sobre uma pessoa, vai lá um perfil com uma foto antiga e pronto. Todos os Sherlock Holmes de Whatsapp já sentem que desvendaram um mistério.
Há uma outra narrativa, ainda mais intrincada. Nela, Alexandre de Moraes e Roberto Jefferson estariam num conluio para derrubar Jair Bolsonaro, o único que ameaça o sistema, o establishment.
Parece absurdo e é. Parece impossível que adultos acreditem nisso, se você não conhece a dinâmica dos grupos de fanáticos políticos. São pessoas que arriscaram a própria vida tomando remédio de piolho no lugar de vacina. Ali, não há fatos que contrariem argumentos.
O Brasil está dividido em três, segundo as urnas. São 57 milhões de eleitores que querem Lula. Outros 51 milhões querem Bolsonaro. Entre quem quer outros candidatos, brancos, nulos e abstenções, temos 48 milhões. São esses últimos que darão o veredito no próximo domingo.
Quem rejeita o lulismo e o bolsonarismo geralmente é contra radicalização política. Para esses eleitores, o efeito Roberto Jefferson é uma bomba. A violência ultrapassou completamente o aceitável e preocupa o incentivo que o episódio pode representar para outros militantes radicais. É o temido "efeito Capitólio".
O evento pode fazer com que antipetistas dispostos a tapar o nariz e votar em Bolsonaro pensem se realmente vale a pena sair de casa para votar. Também pode fazer com que antibolsonaristas decididos a lavar as mãos no segundo turno se animem a tapar o nariz e votar em Lula para virar oposição a ele no minuto seguinte.
Contra o petista nessa história, só a militância do tipo abraço de afogado, que já está xingando a polícia federal. A esquerda cirandeira virou especialista em negociação e está dizendo que foi amistosa demais. Vício em superioridade moral é fogo.
Iniciamos uma semana tensa e histórica em que há apenas uma certeza: independentemente do vencedor no domingo, o Brasil continuará dividido.
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