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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

A dança das cadeiras da Lava Jato continua ideológica

Sergio Moro, Eduardo Appio e Gabriela Hardt - Reprodução de vídeo e divulgação
Sergio Moro, Eduardo Appio e Gabriela Hardt Imagem: Reprodução de vídeo e divulgação

Colunista do UOL

23/05/2023 19h50

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O que fazer com a Lava Jato? Ninguém sabe. A tentativa de substituir um juiz considerado parcial por outro juiz parcial, quem diria, não deu certo. O talento para fazer a mesma coisa e esperar resultados diferentes merece um Oscar.

Tentamos encaixar a operação Lava Jato no contexto da polarização política. Isso não é possível. Esse grupo polariza com a política, não se encaixa na lógica óbvia da guerra entre bolsomínions e luloafetivos que esgarça o tecido social brasileiro.

Deltan Dallagnol acaba de ser cassado por uma ação movida pelo PT e aliados. Apareceu em uma entrevista coletiva ladeado de bolsonaristas. Prato cheio para a apoteose da superficialidade em que vivemos enfiar a história na polarização política.

Não é bem assim. O PL de Bolsonaro tem uma ação de cassação contra Sergio Moro, que apoiou o ex-presidente na campanha. Como a ação dos petistas andou antes, os bolsonaristas se meteram em uma saia justa. Se o PT diz "A", eles precisam ser "anti-A". Dessa vez não será possível.

Políticos entendem que a Lava Jato criminalizou a política. Defensores da operação argumentam que ela criminalizou o crime cometido por políticos, não a política.

Muita gente entende que o STF é completamente contrário à operação em si, não a fatos determinados dentro dela. Esse raciocínio ruiu na semana passada, quando a Suprema Corte condenou Fernando Collor de Mello por ações movidas pela operação.

Talvez estejamos descobrindo que substituir uma parcialidade por outra de sinal trocado não significa equilíbrio. Entender esse fato seria bom para a Justiça, embora torne o enredo sem graça.

A relatoria da Lava Jato, que esteve a cargo de Sergio Moro, foi colocada sob a responsabilidade de Eduardo Appio. O juiz logava no sistema interno como LUL22 e disse ser um protesto contra o que considerava prisão ilegal do presidente. Luloafetivos comemoraram. Mas é algo como colocar na operação um juiz que utilizasse o login BOLSO22. Não tem como dar certo.

Os fatos que levaram ao afastamento de Eduardo Appio vão muito além da parcialidade e são preocupantes para a confiança da população no Judiciário. Ele usou as prerrogativas de juiz para consultar dados sobre os quais tem obrigação de confidencialidade. Esses dados acabaram expostos no Twitter por um advogado. O print mostra a cadeia de custódia. Somente um magistrado tem acesso àquela tela.

No sistema interno, há o registro de que o magistrado consultou um processo onde havia o telefone do filho do desembargador que é sócio do escritório de Sergio Moro e da esposa. Esse filho recebeu um telefonema entendido como ameaça velada e a voz, segundo o que está até agora nas investigações, pode ter compatibilidade com a do magistrado. É um enredo de filme.

Diante do afastamento, a linha direta para assumir o caso é da juíza Gabriela Hardt. Ela ficou famosa pela frase no interrogatório de Lula: "Se o senhor começar nesse tom comigo, a gente vai ter problema". Também teve problema com as sentenças proferidas, acusada de plagiar o que tinha sido escrito por Sergio Moro.

A dança das cadeiras é ideológica e tem um perfume de enredo de ficção. Identificamos os magistrados ideologicamente, não tecnicamente, o que é ruim para a imagem da Justiça.

Têm se tornado cada vez mais comuns ações em que promotores, procuradores e magistrados tentam salvar o mundo. A função deles é aplicar a lei, nada a mais nem a menos. É aí que está a força do Judiciário no sistema de freios e contrapesos dos Três Poderes, na proteção das regras e atuação técnica.