Janones mostra a Lula que bancada hashtag é sinônimo de fogo amigo

Não se apaga fogo com gasolina, mas o mundo político brasileiro tem tentado essa fórmula. Preterido na escolha para a CPI dos atos de 8 de janeiro, o deputado ativou o modo "fogo amigo" para cima do Ministro das Comunicações, Paulo Pimenta.

O perfil do ministro no Twitter compartilhou um pronunciamento oficial na Câmara com o seguinte enunciado: "Ministro Paulo Pimenta apresenta planos do governo na área de comunicação".

André Janones optou por responder publicamente, como se não fosse aliado com acesso ao governo, mas apenas um observador indignado. "Escreva em primeira pessoa. Rede social é local de intimismo. Pra se aumentar o engajamento, se faz necessário criar uma sensação de pertencimento no usuário, ainda que não seja Vossa Excelência quem está digitando. Isso é o 'beabá' das redes sociais", disparou.

Para quem está acostumado ao ambiente de bordel de beira de estrada das redes, parece até educado. Não é. A postagem arrogante dá a entender que o deputado entende mais de comunicação do que o ministro responsável pela pasta. Também expõe a comunicação do governo, que já está sendo criticada.

Durante a campanha, foi celebrada a chegada de Janones e sua estratégia de guerrilha digital, com métodos semelhantes aos do bolsonarismo. Espalhar fake news, fazer postagens alarmistas e xingar jornalistas era o prato do dia. Nas redes funciona.

Existe um público sedento por oportunidades de ser agressivo e maltratar os outros recorrendo a uma desculpa moral. Não atuam assim porque sentem prazer mórbido, estão apenas reagindo ao mal ou lutando pelo bem. Proporcionar essa experiência aumenta o engajamento nas redes e isso ocorreu durante a campanha.

Havia a expectativa de que André Janones ocupasse alguma posição no governo, o que não se efetivou. Era uma linha natural que se implementou no imaginário a partir da premiação da bancada hashtag no governo Bolsonaro. Quem engaja muito ganha funções importantes, segundo essa lógica. O deputado foi alardeado como possível ocupante da pasta que hoje é de Paulo Pimenta.

Mas há uma diferença fundamental entre o lulismo e o bolsonarismo. O primeiro tem uma base social e política sólida, formada durante décadas. O bolsonarismo é um movimento fundado por meio da internet, virando a cara de pautas - principalmente de costumes - que estavam sem um representante há anos.

Muitos dos deputados e aliados da bancada hashtag de Jair Bolsonaro se transformaram rapidamente em fogo amigo quando contrariados. Não conseguiram manter o público, eram parte de um movimento de internet que se amalgama em torno do nome do presidente e de um imaginário coletivo sobre o que ele representa. É um público que despreza a realidade objetiva e prioriza o pertencimento ao grupo virtual, projetando suas próprias expectativas sobre o ex-presidente.

No governo Lula, a atuação da bancada hashtag e de influencers amigos tem funcionado como kriptonita. Eles têm o toque de Midas ao contrário. Nos embates em que atuaram, como o do PL das fake news e a questão dos juros, aumentaram a oposição em vez de fazer crescer o apoio.

O governo não foi poupado de críticas quando colocou sua comunicação oficial nessa lógica de lacração e mitagem. Tripudiar sobre Bolsonaro na ocasião do cartão de vacina e da busca e apreensão não pegou bem nem rendeu vantagem a Lula, pelo contrário.

Por outro lado, políticos tradicionais têm encontrado seu caminho para brilhar nas redes. Flavio Dino é o caso lapidar, mas Randolfe Rodrigues também aprendeu a navegar nessas águas. Ele é quem foi escolhido para a CPI onde André Janones queria estar. Além disso, a atuação discreta e serena de Fernando Haddad rendeu ao governo uma vitória retumbante no arcabouço fiscal.

André Janones resolveu chamar a atenção do governo fazendo o que a bancada hashtag faz de melhor, criar treta em rede social. Resta saber como Lula vai lidar com esse comportamento.