Natália Portinari

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Reportagem

Relator do TCU rejeita acordo que daria contrato de R$ 10 bi à J&F

O relator no TCU (Tribunal de Contas da União) recomendou arquivar uma proposta de acordo que, se concretizada, daria um contrato de R$ 10,5 bilhões à Âmbar Energia, empresa da J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, com o governo federal.

O caso, que trata de contratos da empresa com a União para fornecimento de energia térmica, está na pauta da Corte de contas para análise do plenário nesta quarta-feira (3). O ministro Benjamin Zymler, relator do processo, votou pelo arquivamento.

Procurada, a J&F disse que o caso é sigiloso e que não iria comentar.

A Âmbar tem quatro contratos de 2021 com o governo para fornecer energia através de térmicas, mas não instalou as usinas no prazo previsto. A empresa, porém, sustenta que poderia fornecer a capacidade contratada.

Após um embate na Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), o Ministério de Minas e Energia levou o caso ao TCU buscando uma resolução através da Secex Consenso, secretaria criada no ano passado pelo presidente da Corte, Bruno Dantas.

Na proposta analisada pela Secex Consenso, a Âmbar pagaria R$ 1,1 bilhão que deve em multas e trocaria seu contrato atual, de R$ 2 bilhões anuais por 44 meses, para outro de cerca de R$ 1,4 bilhão anual por 88 meses, tornando o custo repassado aos consumidores menor.

Os contratos foram firmados de forma emergencial no governo Bolsonaro, assim como de outras empresas, em meio à possibilidade de uma crise hídrica. Hoje, associações de consumidores de energia elétrica dizem que sua manutenção onera os cofres públicos de forma desnecessária.

As empresas, por outro lado, dizem ter direito a receber os valores que foram contratados, independentemente da necessidade atual de energia térmica. A KPS e o BTG Pactual conseguiram acordos com o TCU para renegociarem contratos semelhantes aos da Âmbar.

No decorrer do processo, o Ministério Público junto ao TCU e a área técnica da Corte se manifestaram contra a possibilidade de um acordo nesse caso, sustentando que houve um descumprimento grave das obrigações da Âmbar. Isso diferenciaria o caso da J&F dos demais.

A Secex Consenso faz uma análise do risco jurídico -- uma previsão das chances de a empresa ganhar uma ação judicial contra o governo -- e também das obrigações das partes uma em relação à outra.

Em seu voto, obtido pelo UOL, o ministro Benjamin Zymler confessa ter simpatia pela proposta de acordo, mas diz que a ausência de consenso entre os integrantes da Secex Consenso, segundo as normas estipuladas pelo próprio TCU, o força a votar pelo arquivamento.

"Não nego que, no mérito, comungo certa simpatia com o mérito do acordo inicialmente engendrado que, como perfilhei, poderia render benefícios de até R$ 4,9 bilhões nas contas de energia elétrica do consumidor final, em cenário mais conservador, envolvendo a quitação de multas e demais encargos para o sistema", escreveu o ministro.

Zymler ressalta também que o arquivamento não significa que o MME e a Âmbar não possam chegar a um acordo sem o TCU. O intuito da Secex Consenso é apenas dar uma autorização prévia a esses arranjos com empresas, para evitar questionamentos posteriores.

O fator determinante, porém, é que a solução consensual não poderia prosseguir sem o aval da área técnica, que se posicionou contra o acordo ao fim do processo.

A ressalva do ministro Zymler indica que o acordo entre o governo e a empresa pode ocorrer por outras vias -- na Aneel ou com uma mediação da AGU (Advocacia-Geral da União), por exemplo.

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, tem interesse que o acordo saia e tem procurado integrantes da Corte para tentar reverter o cenário. Mas ministros ouvidos pela reportagem dizem que a tendência é que o caso seja arquivado, seguindo o relator.

Mudança nas regras

Quando foi criada a Secex Consenso, o TCU estipulou que só poderia haver acordo se houvesse consenso entre os integrantes da secretaria. Em 13 de março deste ano, enquanto se desenrolava o processo da Âmbar, as regras mudaram.

Em sessão do TCU, os ministros aprovaram uma nova regra segundo a qual, na ausência de consenso, o relator deve submeter o caso ao plenário, para que os ministros decidam em conjunto o que fazer.

Em seu voto, Zymler pondera que essa mudança não se aplica a casos já em andamento, porque isso feriria a impessoalidade. Isso significa que, no caso da Âmbar, a discordância de auditores e do MPTCU impede que o acordo seja chancelado pela Corte.

Teste da Aneel

Como mostrou o UOL, em despacho de 29 de janeiro, a Aneel informou o TCU que três usinas da Âmbar -- UTE Edlux X, EPP II e Rio de Janeiro I -- são capazes de suprir o fornecimento de energia que o governo federal havia contratado em 2021, em termos de capacidade.

Os auditores-instrutores do TCU consideraram que esse teste não mostra que a Âmbar teria cumprido suas obrigações. Pelo contrário. A empresa se comprometeu a instalar quatro usinas, mas demonstrou a capacidade de apenas três, e depois do prazo previsto nos contratos.

O MPTCU defende que o acordo não traria nenhum benefício ao governo e sustenta que o risco judicial da União é baixo.

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