Caciques do centrão distribuem computadores da Câmara para aliados

A cidade mais agraciada foi Campo Formoso (BA), por indicação do líder do União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento. Foram doados 150 computadores, acompanhados de monitores de vídeo.

A prefeitura é comandada por seu irmão, Elmo Nascimento, candidato à reeleição neste ano.

A doação foi formalizada por Elmar em um ofício enviado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Elmar tem relação próxima com Lira e é um dos nomes cotados para sucedê-lo no comando da Casa.

Nos documentos, obtidos pelo UOL, o deputado do União Brasil inicialmente pediu que os computadores fossem distribuídos a cinco municípios da Bahia, mas voltou atrás e decidiu concentrar as doações na cidade do seu irmão.

"Solicito a Vossa Excelência que verifique a possibilidade de atendimento do pedido formulado por gestor do município de Campo Formoso do estado da Bahia, que almeja receber em doação 150 computadores considerados inservíveis para esta Casa, sendo que 2 desses possam ter características de servidores", escreveu Elmar a Lira, que atendeu o pleito.

Quem recebeu a doação em nome da prefeitura de Campo Formoso foi um funcionário do gabinete de Elmar. Os termos de doação normalmente proíbem que funcionários da Câmara recebam esses itens em nome das prefeituras, mas, nesse caso, isso foi liberado.

Na Paraíba, por indicação do senador Efraim Filho (União-PB), os municípios de Tenório, Camalaú, Brejo do Cruz, Cruz do Espírito Santo, Bonito de Santa Fé, Poço Dantas e Caaporã receberam 120 computadores. Efraim era deputado quando fez o pedido.

Procurado, o senador disse ao UOL que "eram cidades carentes de demanda por equipamentos de informática e sem condições de adquirir com recursos próprios". "Tanto que são de diversos partidos diferentes", disse.

Os entes beneficiados pelas doações foram informados pela Câmara dos Deputados à reportagem via Lei de Acesso à Informação (LAI).

Em 2022, foi aprovada uma lei que regulamenta a Política Nacional de Desfazimento, prevendo a doação de bens móveis entre órgãos da administração pública, pessoas físicas e jurídicas e entes privados.

Existe um sistema administrado pelo governo federal, o Doações gov.br, que dá transparência a essas transferências de bens e conecta órgãos públicos dispostos a doar com outros que estejam precisando.

A Câmara também faz uso desse sistema e, desde 2022, doou 3.979 bens para universidades e outros órgãos públicos, principalmente computadores e monitores, mas também móveis e baterias.

No caso dos computadores doados diretamente a pedido dos parlamentares, porém, não foi usado o sistema do governo.

Funcionários da Câmara que acompanham esse assunto relataram ao UOL, sob condição de anonimato, que receberam uma orientação neste ano eleitoral para priorizar doações a prefeituras e não enviar os computadores a universidades. Essa estratégia seria adotada para turbinar as bases eleitorais dos deputados.

A Câmara disse ao UOL que doa "bens considerados inservíveis após a devida instrução processual e técnica e sem gerar quaisquer ônus adicionais para a Casa".

"Os processos administrativos para doação de bens inservíveis somente têm início mediante a solicitação prévia de órgãos públicos estaduais, municipais ou distritais; empresas públicas federais ou sociedades de economia mista federais prestadoras de serviço público; ou por organizações da sociedade civil (incluídas as sociais) e associações e cooperativas."

"Nos últimos dez anos foram doados diretamente mais de 7.000 computadores inservíveis para esta Casa. Desde 2022, foram doados diretamente 485 computadores em desuso."

"A doação de 100 computadores ao Município de Maceió ocorreu por solicitação do Iplan (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Maceió), que cumpriu todas as exigências legais para receber os equipamentos", diz a nota.

Procurado, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, não comentou. O deputado Elmar Nascimento também não respondeu.